quarta-feira, 21 de novembro de 2012

BAFO QUENTE DE UM PASTEL BARATO SEM RECHEIO

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Algumas coisas passam por nossas vidas sem a percepção devida. Alguns têm sua vida toda passando pelos olhos e nem se dão conta. Bem como lembrar-se do guarda-chuva depois de começar a tempestade ou descobrir um câncer já na fase terminal.
Olhos abertos nem sempre apontam para o lugar certo.

Imagine se pudesse voltar ao tempo.
Numa grande máquina ou um carro como o Delorean e voltar vários anos atrás.
Imagine confrontar todos os seus medos irremediáveis que não se importam se é de dia ou de noite. Os monstros te arrancam a paz e devoram-lhe a alma com um sorriso sinistro no rosto.

Bem, você voltou no tempo. Aquele tempo que você era um cara feliz e tinha coisa para lhe tomarem, logo, o passado não é feito só de tormento e apocalipses. Naquele tempo de dias de comercial de cerveja você também reviveu os sorrisos, as palavras adocicadas como doce de banana. Reviveu as juras de amor eterno e as confidências, bem como saber que não era só você que assustava-se com aquele amor sem medidas, infinito, como um vulcão de tão intenso.

Eis que você poderia jurar que aquele momento tenha sido só um sonho, daqueles de implorar com todas as forças para não acordar. Mas se era um sonho bom, você não lembraria, pois nunca lembra-se dos sonhos bons, lembra?

Você voltou no tempo por alguns instantes e os olhos secos de outrora agora nadavam no mar de Poseidon de seus desejos. Era um mar de emoção, sem tristezas e você estranhou aquilo. Sabia o que era aquilo? Não, não sabia. Já tinha se esquecido.

Era alegria e não reconhecia a palavra, logo, buscou seu significado em todos os dicionários, em todos os idiomas e nenhum deles, absolutamente nenhum pode traduzir aquela sensação que transbordava seu peito que há tempos estava tão oco e descartável como uma lata de cerveja vazia numa segunda-feira de manhã.  Algo em seu inconsciente, na tentativa de trazê-lo aos tempos modernos alertava-o sobre a distância, mas... Distância?

Sentia tudo aquilo ao pé do ouvido. Poderia jurar que ouvia o deleite do tom de voz, cada nota. Jurava que sentia a respiração remexer seus pelos. Pôde imaginar cada sorriso e cada feição de saudosismo. Podia sentir alguma coisa e isso por si só já era uma grande novidade para quem por milênios não sentira sequer o bafo quente de um pastel barato sem recheio. Então você voltou ao tempo e percebeu que nem mesmo o passado está igual. Até mesmo ele dissimulou-se com a alquimia do Destino e tornou-se só mais um largo buraco negro numa história parecida com suas lembranças. Ao lembrarmos de algo só resgatamos as partes boas da memória e vice-versa. O resto sequer vale a pena.



Bento.

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