quarta-feira, 7 de novembro de 2012

OLHOS VERDES QUE VESTEM RIMEL


-


Eu queria começar dizendo que talvez eu possa ser um pessimista. Não que eu me esforce para isso, algumas coisas simplesmente acontecem. Ou você nasce com isso, mais ou menos como orelhas de abano ou sorriso com covas. Porém, dizer que eu sou pessimista é simples demais. Tão sem sal e sem açúcar para um sujeito como eu que gosta de complicar as coisas.
Bem como um amigo que não vejo há tempos. Quando saíamos para beber e conhecer garotas ele sempre dizia mirando o dedo para uma bela garota: essa daí não! E não tinha discussão, tentávamos fazê-lo mudar de ideia, mas nada funcionava. Ao indagarmos sobre a birra que tinha com algumas garotas, apesar de bela ele profetizava: essa aí é uma pré-gorda, ela ainda não sabe, mas será gorda no futuro e como toda gorda, será carente e ciumenta. Não entendíamos muito na época, porém, ele preferia assim, esperar sempre o pior.

Já eu poderia dizer que sou um dramático irremediável, daqueles que fazem de uma recepção de dentista uma tragédia shakespeariana. Então isso pode ser uma coisa para se preocupar e talvez trocar a recepção do dentista pelo analista, ou seja, só um caso de ótica incomum.

De qualquer forma, essa dramaticidade se deve muito a falta de fé naquele romantismo aficionado pelas novelas e o cinema. Desacredito em moçinhos e pessoas que devolvem malas de dinheiro achadas na rua. Eu prefiro acreditar que existe sim, bondade em todos nós, mas na mesma quantidade que existe a maldade. Somos todos seres ambíguos. Se duvida, faça uma experiência. Coloque um grupo de pessoas numa sala e os deixe sem alimento e água por um bom tempo e terá uma carnificina seguida de um banquete de carne humana. Pode chamar de sobrevivência, instinto e etc., etc., etc. Eu chamo de natureza, fato corriqueiro. O ser humano só é bom por comodidade, para que a vida em sociedade seja algo possível e agradável. Basta os quesitos "viver" e "sociedade" estarem em risco e lá se vão o bom senso e civilidade. É simples assim.

Ainda falando dessa ambiguidade eu, ranzinza que sou, me pego reclamando de uma tempestade quando a mesma se despede para dar lugar ao sol de arco-íris e voltar a lamentar-me por não ter tirado um bom cochilo durante a chuva.

Praguejo por coisas que nem me lembro mais do porquê. Relembro coisas do passado só para fechar a cara e manter o estado de espírito, preciso disso, é minha fonte de agonia e inspiração. Caso contrário escreveria sobre flores do campo e crianças com lares perfeitos, um saco, tudo seria um saco de estrume sem pretendentes.

Pensei nisso ao conhecer uma garota e perceber que lá estava eu em busca de algo para reclamar. Como seria? Me foquei em seus pés, deveria ter uma unha torta ou um calo amarelo e nada. Então seriam as rugas dos joelhos que fariam meus olhos revirarem e não passou nem perto. Seu cabelo era lindo, loiro e cheiroso. A vaidade dela era tão grande quanto desejada. Os olhos eram verdes e vestiam rimel. Fui atrás de gorduras extras e ela era magérrima. Sabendo que sua aparência física estava em ordem pensei em buscar algo para acusá-la em nossa relação e nem assim obtive sucesso. Poucas vezes tive alguém que quisesse tanto me agradar. Desisti. Não dela, é claro, desisti de procurar nela, algo que me desse motivos para lamuriar, logo, sobrou-me discutir e reclamar de mim mesmo.


Bento. 

Nenhum comentário: