sábado, 15 de março de 2014

UM SUJEITO SEM DEMÔNIOS NÃO É SEQUER UM SUJEITO

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Acredito que estou em débito com minha inspiração, ela que já me ajudou tanto, não estou fazendo quase nada para ajudá-la. Não estou fazendo e isso é fato. Um escrevinhador como eu precisa de musas para dar um empurrão na maldita escrita e eu tratei de afastar todas elas. Afastei porque eu tenho essa mania de afastar as coisas, às vezes acerto, às vezes nem tanto, mas ninguém se importa quanto aos meus acertos, não se importam porque simplesmente não é importante. Bem, quero confessar que quando digo "ninguém" quero dizer "eu". Se você que está lendo isso achou confuso, volte e leia do começo, mas com atenção desta vez, estou sem tempo para ficar explicando.

Na verdade estou sem tempo para quase tudo. Com exceção das coisas básicas eu quase não faço nada a não ser vestir qualquer coisa e sair para trabalhar. Aliás, trabalhar tem sido cada vez mais sacrificante, porém um sujeito como eu, cheio de vícios, precisa de um salário no fim do mês para dar conta do recado. Curioso que estou tão sem tempo que mesmo meus demônios não me acham para uma conversa de fim de noite e um sujeito sem demônios não é sequer um sujeito. Veja então minha situação.

Por vezes me sinto num grande vazio, só ar e vazio e paredes sem cor e poucos idiotas que levantam-se da merda e me fazem desviar o olhar, no entanto não por muito tempo porque estou sem tempo até para indignar-me com idiotas.
Estou há dias de fazer uma viagem no intuito de pintar as paredes, pois preencher o vazio é querer demais, se ainda fosse Vegas, mas não, então temos de nos contentar com o que temos.

Esses dias me peguei pensando sobre um bom amigo que tenho, que creio eu, está passando por seu momento mais feliz, em toda sua vida, curta, mesmo assim o melhor momento. Fora inevitável a comparação, pois o que ele vive hoje eu já vivi e estraguei. Pensei e torci e ainda torço para que ele seja mais esperto que eu. Caso não seja mais esperto, então que seja menos explosivo, isso com certeza ira ajudá-lo a não estragar tudo.

Estou fazendo as malas aos poucos e a cada dia jogo lá uma peça de roupa, sem me importar muito. Eu dei férias a minha vaidade exatamente por não estar com disposição para ajudar minha inspiração, então tanto faz. Penso na viagem e juro, a trocaria por uma dor de barriga no intuito de sentir algo, mesmo que dor, porém mesmo as doenças não me encontram. Bebo e não sinto a ressaca, durmo antes do bocejo e acordo antes do despertador. Até a dor de tatuar a pele dói com tanta insignificância que só as faço como forma de manter o vício. "Somos movidos a sentimentos" uma garota me disse uma vez e eu assenti, mas se não sinto, sequer ódio, ou riso, não sinto nem frio nem calor o que resta então? Membros, uma barba enorme e a sensação de que vou apagar essas letras antes mesmo de terminá-las.

Esses dias sonhei que estava caindo. Belo sonho para quem quase não sonha. Caía num poço extremamente profundo, apertado, caía de cabeça. As paredes do poço eram espelhadas e eu me via caindo durante horas. Era estranho, pois cada vez que olhava para meu reflexo eu estava mais e mais velho. Percebi que era um sonho quando me vi aparentando uns cem anos, afinal, com os meus vícios seria um milagre eu chegar a tanto. Meus cabelos iam ficando cada vez mais grisalho, meu rosto cada vez mais cheio de rugas, o nariz e as orelhas ficavam maiores que já são e os cabelos que já estavam brancos ficavam ralos e por fim caíam assim como eu caía naquele poço. Enfim quando eu ficava tão velho quanto um tomate seco eu voltava para a idade atual. Uma coisa de doido, um sonho de maluco, mas não se pode julgar os sonhos. Quando acordei tive que me esforçar para lembrar o sonho todo, porque sonhos vivem escapando de nós, qualquer vacilo e pronto. É claro que pensei sobre o assunto pelo menos durante os três primeiros cigarros do dia, ou seja, mais ou menos meia hora e a conclusão mais razoável que cheguei foi que o tal sonho nada mais é que um reflexo de toda a minha vida. Sim, pois eu vivo me repetindo, entre jeans velhos, erros, defeitos, eu sempre repito as mesmas merdas, uma após as outras, de tempos em tempos, um ciclo infinito.

A última semana eu fiquei sem um gole de nada alcoólico, nada mesmo. Às vezes faço isso só para provar que sou capaz, porém não gosto. Há poucos prazeres na vida para me privar de qualquer um deles, portanto, faltando um dia para completar uma semana resolvi que já era hora de tomar um trago forte e amargo de qualquer coisa. Parte de mim gostaria de ficar bebendo o dia todo e escrever, escrever até que a inspiração bata em minha porta para que eu possa lhe oferecer um café. Outra parte gostaria de ler algumas coisas novas, originais, visceral, só que tudo que acho na internet não passa de baboseira hipócrita e lenga-lenga de jovens que acham que estão escrevendo algum roteiro para a Walt Disney. Logo, só acho essa brecha nos velhos autores de costume. No entanto eles estão mortos, ou quase, e quando terminar de ler tudo não sobrará mais nada. Então, quando penso nisso é que outra parte de mim gostaria de tocar o foda-se pra tudo isso e sair por aí com meus amigos mais retardados e maníacos fazendo um monte de merda por todos os lugares que passarmos e de preferência não deixar uma gota sequer de álcool fora da garganta. E nós faríamos isso muito bem porque é o que fazemos de melhor, beber, fazer merda, arrumar confusão e depois contar histórias. Fazemos isso porque aceitamos totalmente quem somos, sem forçar, sem fingir, sem lamentar. Não somos grande coisa, temos ciência disso e estamos pouco nos fodendo, pois só um idiota finge ser uma coisa que não é.

Eu conheci uma garota uma vez com asas nas costas. Ela tinha um lema; um dia de cada vez. E isso não era só porque ela já tinha sido uma cheiradora de marca maior, isso era para a vida. "Um dia de cada vez". Não se pode atrasar ou adiantar o relógio, então as merdas de outrora você tenta não repeti-las no futuro. No meu caso, eu tento e por vezes não consigo e isso me incomoda, mas às vezes me faz rir, afinal, sou como um mecânico de minha própria vida, das engrenagens de meu Destino, vivo de concertá-las, calibrá-las, trocar peças. Trocar peças é o meu ponto forte, no entanto, algumas peças são mais belas que outras, mais geniosas que outras, mais esperta que outras, mais sexy que outras, mais leoninas que outras e por isso o encaixe não é perfeito. Fazer o quê?



Bento.

quinta-feira, 6 de março de 2014

A SOLIDÃO É COMO AQUELA CALÇA JEANS FAVORITA

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Idiotas costumam denegrir os solitários, mas desfazer de uma boa e límpida solidão é burrice.  Os maiores gênios de nossa historia eram solitários convictos, singulares em todos os aspectos, homens que dialogavam consigo mesmo e isso prova que você é o melhor amigo que se pode ter. Só você. Mas tudo isso soa como um clichê imenso, o que eu quero dizer é que a maioria das pessoas, quase que em sua totalidade, não merecem sua companhia. Sim, eu estou dizendo que a maior parcela da sociedade sequer merece a bosta que cagamos, tamanha mediocridade, no entanto, isso é chover no molhado, pois de tão medíocres não se dão conta do que estão perdendo.

Isso é mais ou menos como o ser inútil que permanece próximo só que não ouve. Saber ouvir é bem importante, apesar de contraditório. Contraditório sim, com tanta ignorância desses invertebrados disfarçados de homens, mulheres, pais de família, ouvir é o caminho mais curto para a alienação. Saber ouvir e não ter senso crítico é o mesmo que estar numa guerra armado até os dentes, mas com seu arsenal apontado para o próprio peito. E nós estamos numa puta de uma guerra e estamos perdendo, cara. Olhe para o lado e me diga o que vê. Longe de mim querer ser o mensageiro de más notícias, nem quero que me confundam com algum profeta apocalíptico, mas este país vai de mal à pior. É o fim dos tempos e em algum momento seremos dominados pelos idiotas, como zumbis apontando seus dedos julgadores e fétidos para os que não se adaptarem aos idiotas. Um colapso nos aguarda. Nunca nossa política foi tão corrupta aos nossos olhos sem que ninguém se manifeste, nunca a indústria foi tão mesquinha e débil, a TV está dominada por pastores e ignorantes. As ruas já foram tomadas há tempos por bandidos e polícias corruptos e medrosos. Sem falar nos jovens dementes reboladores e sem cérebros. Se você consegue me compreender vai concordar comigo, porque acredite, a maioria não tem a mínima ideia do que eu estou falando, também pudera, sequer sabem o que estão fazendo.

Mas quero voltar a falar de solidão, que nestes tempos de guerra não é de toda uma má ideia. Só que eu também não sou o antissocial que alguns pensam, eu me misturo como todos os outros, é claro que com um pessoal seleto e mesmo assim, depois de algum tempo me misturando preciso me desintoxicar, preciso conversar comigo mesmo e a sós. Alguns imbecis confundem isto com carência, porém, se existe uma coisa neste mundo que não se deve levar a sério, esta coisa é o imbecil. A solidão é como aquela sua velha calça jeans favorita, que de tempos em tempos você tira do guarda-roupa para se sentir melhor. Existem algumas garotas que me lembram exatamente esse jeans velho. Mesmo com o passar dos anos elas continuam ali, conhecem seu corpo como ninguém, ajustam-se a ele como ninguém mais faz. Sabem o que você está pensando só de olhar. E por vezes você gostaria de tirar certas garotas do fundo do baú sem ressentimentos. A última coisa que se pensa, neste momento, são os acasos que os fizeram afastar-se, neste momento a garota vira uma santa e por alguns segundos você passa a se culpar. Mas é só um jeans rasgado entre tantas lojas oferecendo uma porção deles por preços baixíssimos e o melhor, jeans novos não vem com ressentimentos. Seria tudo muito simples caso nós não gostássemos de dificultar as coisas. Sim, temos o péssimo hábito de sentir falta das coisas que não possuímos mais, isso nos torna menos racionais, como se já fossemos muito. Então existem algumas garotas que nos causam isso e antes que me perguntam eu respondo; garotas também adoram jeans velhos. Eu mesmo sou um jeans velho de algumas, não há mal nisso e não é depreciação nenhuma assumir isso, afinal, jeans velho nunca sai de moda. Eu tive um amigo - e digo que tive, pois nos afastamos - que vou chamar de Fausto. Fausto tinha uma síndrome do jeans velho tão agressiva que chorava ao se masturbar pensando em suas antigas transas. Não era amor, nem saudade, nem arrependimento que magoavam Fausto, eram seus malditos jeans que ele procurava como um maluco dentro de seu guarda-roupa e não achava, às vezes, quando achava o jeans já não lhe servia mais e isso tornava seu momento de solidão um inferno.

Você pode se perguntar do porque alguns solitários se prendem ao passado ao invés de seguir com suas vidas em direção ao futuro e eu digo que é uma resposta simples; o passado é sempre mais real e palpável. Dizem que não se pode mudar o passado e eu digo que podemos sim. Podemos torná-lo mais tragável, podemos mudar os culpados pelas tragédias de tempos atrás colocando a culpa nos outros ou em nós mesmos, fazemos isso o tempo todo. Toda vez que se olha para o passado ele mudou um pouco, pois é o que somos, um bando de moldadores de passados solitários. Por isso é tão mais difícil olhar para o futuro, pois este nós não controlamos nada, tudo pode acontecer, para o bem ou para o mal e o fato de não saber e não ter poder sobre ele nos afasta cada vez mais, fica mais fácil correr até uma costureira e mandar apertar um pouco a cintura daquele jeans velho.


Bento.

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