quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

O POETA E O FILHO DA PUTA

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Não existe no mundo nada mais clichê que uma manhã chuvosa em São Paulo. Claro, digo isso para quem acorda cedo e sai de casa antes mesmo do Sol tomar sua segunda caneca de café.
Eu sou um paulista que odeia garoa e frio, exceto claro, quando estou em casa dormindo. Todas as coisas me convêm quando são ao meu favor.

O problema é que eu não estava dormindo, não estava sequer em casa e acabei descobrindo que fui excluído do Facebook. Digo, não da rede toda, mas uma pessoa específica me excluiu. Tudo bem, não foi a primeira vez, nem foi a primeira vez que esta pessoa me excluiu de alguma coisa. Primeiro fui extirpado da vida dela, depois do Facebook. Eu disse tudo bem? Porra! Quem eu estou tentando enganar? Tudo bem é o caralho. Fiquei puto. Com sangue nos olhos. Boca seca e morrendo de vontade de beber e descontar a raiva nas garrafas. Ou talvez sair e comer a garota mais bonita que eu encontrar. O problema é que eu estava num ônibus lotado, careta e atrasado para o trabalho.

Então venho ruminando o fato de ter sido excluído até agora. Eu parei de tentar buscar explicação para o fato de ainda me importar com qualquer decisão tomada por uma garota da qual eu não toco há cinco anos e aconselho vocês a nem começarem. Nem tudo tem explicação. Pelo menos não uma explicação razoável.
Alguns autores bostas de autoajuda dizem que as coisas são exatamente como devem ser e eu acho isso uma forma de tirarmos a responsabilidade das nossas costas pelas merdas que saem das nossas bundas. Então eu venho com outro clichê dizendo que a vida é um ciclo e de tempos em tempos eu tenho algo parecido com uma TPM. Tenho meu período de me maltratar. Meu período de maltratar o próximo. O período de assassino em série e o de querer foder todo mundo. Também tenho o período de beber muito e aquele de beber um pouco mais. A fase de mais destilados que fermentados e vice-versa. A fase de ser atacante e a de ficar na defensiva. O casulo e a lagarta. O poeta e o filho da puta. Tudo muda o tempo todo menos isso. Cem por cento menos um, menos dez, menos mil.

Bom, nesta minha fase o sol é insuportável, o frio é insuperável, o mormaço me sufoca e só o que liberta-me é amaciar a mente com tragos firmes e intensos. Algumas pessoas diriam que isto não passa de uma desculpa para beber. Mas quem de nós não passa a vida inteira procurando desculpas para qualquer coisa? Se o Diabo é o pai da mentira também é padrasto da desculpa e eu pedi tantas, incansavelmente, nem todas merecidas, porém às pedi mesmo assim no intuito de provar arrependimento. Claro que eu não consegui e estar na pele de um perdedor é ruim para um vaidoso como eu.

Mas por que a exclusão? Por que agora? Psicólogos diriam que este sentimento é só curiosidade de saber o motivo. Eu diria que psicólogos ganham dinheiro fácil. Há curiosidade. Mas nesta minha Sina eu me pego pensando o que não há?
Tudo no mundo é alimentado por alguma coisa. Desde os átomos aos micróbios. É a energia que move o mundo e meu alimento era saber que ela poderia estar olhando como ela me revelou uma vez. Não sempre, em algum momento, um mínimo instante, qualquer fração de segundo e lá estaria ela vendo-me, lendo-me, agora, nada. Nada!

Nem um sopro de ar, nenhuma fagulha de chama, nenhuma ficha para apostas. Sem portas nem janelas. Sem vista, nem olfato. E é quando eu quero culpar e culpar. Culpar Deus e o Inferno. Rasgar a carne, extirpar órgãos. Usurpar sonhos. Estuprar as virgens dos paraísos, destruir religiões, estraçalhar sorrisos e matar tudo que é belo. Quero incendiar igrejas e demolir santuários. Quero esquartejar anjos, decapitar santos e pendurar suas cabeças como exemplo, quero destronar o Diabo, aleijar demônios, vingar-me do destino e banhar-me em todo o sangue. Maldito, sorrir e me banhar. A morte como estandarte. Gargalhar com a desgraça toda e brindar em cima dos cadáveres. Pois é tudo o que tenho. E só o que tenho e duvido muito que mereço mais que isso. Sequer isso.


Bento.

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