Alguns são tão idiotas, mas tão idiotas que eu desconfio de
tanto talento. Não acredito e pronto. É tanta falta de credo que acho que é
fingimento, porém penso; só um idiota para fingir tamanha idiotice. Também é
possível que essa certa intolerância com idiotas parta de um estado de espírito
um tanto quanto irremediável, de estar de saco cheio de qualquer coisa e sobre
tudo. Irremediável, mas não voluntário nem eterno.
Então esse "saco cheio" foge um pouco da literalidade,
na verdade isto se aplica à realidade infame, tediosa, ensebada e irritante. Um
rotina transparente e demente de; puta que pariu os dias passam e as horas
continuam sempre no mesmo lugar. Assuntos desfalecidos, conversas previsíveis,
falências das palavras. Como se eu estivesse "emburrecendo", se é que
isso existe.
Evidente que um emprego de merda ajuda a seguir com a
desgraça. Mas o que eu quero deixar claro é que tanta inutilidade está até
conseguindo tirar o charme do bar e olha que cervejas e mesas rústicas com
garçons me chamando de Bêêênto sempre fora um lugar sagrado. Sinto-me o último
dos pecadores num mundo de santos infames.
É bem verdade que eu já tive diálogos mais interessantes e
abandonei-os sistemática e conscientemente, no entanto quem diria que eu
mergulharia num infindável calabouço de mediocridades.
Acordo com o desespero de outrora e se não me engano, por
motivos não tão diferentes. Não pensem que é exagero não, é desespero de faltar
ar no peito e a barriga colar às costas. Das sobrancelhas quererem tomar os
olhos tamanha a rigidez da feição. Também não pensem que pode ser só mais um
dia que o humor partiu sem hora para voltar, é mais que isso. Mas então penso;
por quê? Ontem não foi melhor que hoje e hoje não será pior que amanhã, ou
talvez eu dê esse azar, porém não sou homem de acreditar em azares. Acredito
que só tem azar quem tem sorte e eu estou bem longe de ser sortudo desses que
ganham na loteria, no bingo, sorteios de rádios e etc. Está certo que vez ou
outra achei uma ou duas notas de reais perdidas por aí, mas sei que perdi mais
que achei, então não vale.
Fico sem saber então? Claro, não posso deixar de dizer que
existe um dia ou dois que torno-me ranzinza mais que o normal só que neste caso
foi pior que isso. Sei só que foi uma confusão que há muito não presenciava. De
uma singularidade de insultar o chefe e matar os vizinhos. Resisti em comprar
uma arma por achar assassinatos com armas muito clichê. Os Serial Killers que
usam as mãos são bem mais sentimentais, existe um mantra, uma poesia em cada
corte, cada tripa retirada. Ninguém estripa por estripar, há sentimento no ato,
então resisti.
Sei que o dia foi passando com a lentidão dos dias ruins e
acontecendo fatos para piorar tudo, porém, como já disse, era difícil piorar,
mas a simples tentativa de fazê-lo já me irritava ainda mais.
Logo, o dia estava chegando ao seu fim, sem chefes agredidos
e sem vizinhos chacinados. O dia estava tão merda que só chovia por onde eu
passava e foi aí que aconteceu. Muitos dirão que foi um fim de dia clichê,
tratando-se de quem é. Eu discordo. Foi lindo e mágico ao mesmo tempo.
Eu e o whisky tínhamos tido uma briga feia. Dessas de ficar
sem se falar por dias. Fui eu quem
resolveu tomar a iniciativa e parei no caminho para uma garrafa nova. Sequer
cheguei a abrir a garrafa, não precisou. Era como rever um amigo de longa data.
Tocamos-nos, sem nos falar, bastou um trocar de olhares, um sorriso de canto de
boca, o primeiro sorriso do dia. Onde diabos estávamos com a cabeça quando
brigamos? Acabou o dia ali, era outro agora, melhor, mais tragável. Não
precisávamos dizer nada, como velhos amigos bastou um olhar. Tudo poderia ser
nosso novamente, o mundo e todo o resto. Éramos dois, a sós, poderíamos conquistar
a tão sonhada eternidade, mesmo que malditos, eternos.
Bento.
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