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Parte de mim esta aqui. Deitado em meu quarto, com o livro
do Bukowski ao lado que não tenho coragem de abrir. Na verdade tentei engatar
na leitura por três vezes e não consegui. Coloquei alguns Blues pra rolar, mas
mesmo assim olho para as paredes, os pôsteres e nada. Albert King faz um
vibrato na guitarra suficiente para deixar qualquer fã com os pelos do braço
arrepiado e eu sequer ergo os olhos para contemplar.
Fica estranho quando você faz todo o mantra para escrever.
Antes algumas cervejas, uma dose de um bom Bourbon e espera a inspiração vir só
que ela não vem. Nessa brincadeira foram vinte latas de cerveja, meia garrafa
do Jim Bean e um maço de cigarros e nada. Absolutamente nada. Apelei para as
fotos antigas e mesmo assim foi como ver paisagens do Bing. Senti vontade de
matar duas ou três personagens que nelas estavam e pensei que poderia partir
daí para escrever qualquer coisa, mas me enganei.
Mais Blues, mais Bourbon, mais cigarros e cervejas e não
escrevi uma linha sequer. O pior? Eu ainda enxergava meus dedos e onde eles
tocavam.
Passei a pensar no outro dia e comentar sobre transar com
amigas que bebem como gente grande. E transam como gente grande. E pensam como
gente grande. Aquele tipo de garota que faz tudo aquilo que tem vontade e eu as
respeito por isso. O tipo de garota que faz tudo que um homem faz só que
melhor.
Eu sempre tive um fraco por garotas marrentas. Que fazem
barraco na rua por ciúmes. Que gargalham alto e choram quando estão com raiva e
não fazem questão de esconder de ninguém. Porque garotas assim sentem tudo a
flor da pele e sempre me passam a imagem de verdade. Eu posso estar errado num
caso ou em outro, mas em suma é isso.
Se voltar alguns textos verá que eu tinha tempo para dar e
vender. Hoje eu gostaria de ter para compra-lo, pois não está fácil. Não tenho
espaço na agenda sequer para me masturbar, quanto mais fazer social com uma
garota enquanto ela está deitada em minha cama tamborilando os dedos na borda
do copo de whisky pensando quanto tempo é necessário para que ela tire a roupa
sem que eu pense que ela é uma vadia. O que essas garotas não sabem é que
quanto mais vadia, mais eu gosto. Gosto, pois como costumo dizer; pureza só é
bom para nossas filhas e a vodca. Gosto das vadias porque ninguém é santo e
quem finge ser pode fingir várias outras coisas e eu não gosto de fingimento.
Logo, tire a roupa quando achar que deve e se quiser começar tirando a minha
ganhará pontos por isso.
No trabalho, todos os dias, depois de um dia cansativo,
antes de acabar o expediente, sempre na mesma hora, eu saio para fumar um
cigarro e desacelerar os pensamentos. E todos os dias, como se combinássemos,
vem um gato preto até onde eu estou sentado fumando. Ele se aproxima como os
gatos fazem. Cautelosos e lentos. O gato passa por mim, mas sempre notando
minha presença e eu a dele. Ignoramos-nos, mas não deixamos de nos notar. Então
este gato entra num bueiro como um rato faria. Ele entra todo no bueiro, dentro
mesmo e fica lá por alguns minutos. Eu acendo sempre mais um cigarro para vê-lo
fazendo seu ritual. Então, finalmente sai o gato com uma barata na boca. Às
vezes uma barata mais traiçoeira foge correndo do bueiro e o gato preto e magricela
sai atrás dela até alcançá-la. Mas o gato não mata a barata. Ele apenas quer se
divertir. A barata, é claro, não entende. O vê como uma ameaça. E o gato
cuidadosamente bate na barata com suas pequenas e macias patas forte o
suficiente para que o inseto corra e ele corre atrás dela. Na falta de um rato,
este gato brinca com as baratas. E todo dia é assim. Este é um gato de rituais.
Todos os dias, reserva-lhe aquele período para curtir com a barata.
Eu também sou um animal de rituais. Não levanto da cama
antes de um cigarro. Não entro no banho sem antes tomar uma grande caneca de
café. Não faço nada sem música, nem cagar, nem comer, nem dormir ou transar.
Passo um bom tempo na frente do espelho aparando a barba e arrumando o cabelo.
Assisto aos jogos do Corinthians sempre no mesmo sofá, tomando cerveja e com o
volume ao máximo, e grito com o juiz mesmo sabendo que não serei ouvido.
Dificilmente passo um dia sequer sem cerveja. Não durmo sem o último cigarro,
pois aquele pode ser realmente o último. Nunca se sabe quando vamos acordar ou
dormir definitivamente, então todos os dias fumo meu cigarro antes de dormir
refletindo sobre aquele que pode ser meu último cigarro. Não transo sóbrio
porque tenho sempre a companhia de meus demônios. A última garota que transei
sóbrio foi há um pouco mais de cinco anos. Para ser sincero, a única coisa que
faço sóbrio é trabalhar, de resto...
Então talvez, resumidamente meu ritual é estar bêbado? Sim,
ou grande parte dele pelo menos. Consigo fazer várias coisas ao mesmo tempo
apesar de não gostar, prefiro fazer uma coisa de cada vez e também é assim com
garotas, com exceção, claro, se elas estiverem juntas. Se vou mentir começo
sempre com a palavra "então" após uma pergunta, que é para dar tempo
de pensar na mentira, mas também não gosto de ter de contá-las. Prefiro guardar
minha criatividade para outras coisas. Podem ser rituais ou TOC. Nunca sei
dizer ao certo. Sendo assim, não é difícil imaginar o quão complicado acho
manter um relacionamento com qualquer mulher. Não se encontra em qualquer lugar
garotas dispostas a aturar caras com todas essas manias. Normalmente mulheres
não têm rituais, o humor delas é inconstante, o meu não. Estou sempre de mau
humor, pelo menos de manhã.
Dito isso, decidi me afastar um pouco de garotas. Por um
tempo, sem pressão. Parei de ligar e convidá-las para qualquer coisa, deixei de
atender as ligações e responder mensagens. O motivo disso é difícil explicar.
Estou num grau de tédio que supera qualquer coisa. Um desinteresse coletivo. É
preciso uma coisa muito, mas muito interessante mesmo para me tirar de minha
companhia solitária. Ultimamente só abro a porta de casa para duas garotas ou
mais, assim elas conversam entre si e eu posso perder-me em meus pensamentos
inúteis.
Chame isso de preguiça se quiser. Pode chamar de covardia
também, eu chamo de tédio. E tem mais. Eu estava entrando numa vibe de ser
bastante procurado por garotas comprometidas e estava gostando disso. Nunca
gostei de me envolver em relacionamentos alheios, porém estava me envolvendo.
Talvez, também por isso resolvi dar um freio nesta bagunça toda. Mesmo porque
eu tenho uma coisa de chamar atenção de maridos e namorados. Mesmo aqueles que
não conheço, só ao ouvir falar de mim já me odeiam. Algumas garotas me dizem,
naquelas conversas sem propósito que levamos quando não se vê alguém há muito
tempo, elas dizem: Meu namorado te odeia. E eu sequer conheço esses namorados
ou maridos. E eu sequer dei qualquer motivo para que eles me odeiem. De
qualquer forma, não ficaria surpreso se um dia fosse assassinado com um tiro
bem no meio dos olhos por um desses caras ciumentos. Sem motivo, simplesmente
por suas garotas não foderem com eles direito. Simplesmente por suas garotas
não os chuparem direito, ou por suas garotas trocarem os nomes deles pelo meu
na hora da foda. Será? Soube de uma ou duas que fizeram isso, só que eu tenho
tanta responsabilidade por isso quanto tenho pelo aquecimento global. Algumas
pessoas me superestimam demais. Eu sou só um cara, e com tantos problemas que
se soubessem provável que deixariam de notar minha existência.
Então, por isso eu não passo mais meus dias telefonando ou
puxando conversa com garotas que eu mal conheço. É cansativo e desinteressante
no momento. Não movo um músculo, não sem antes uma boa recompensa. Como
qualquer pessoa que escreve, inevitavelmente reflito sobre o final de qualquer
história antes de começá-la.
Bento.
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