Eu sempre
disse que tenho uma queda por enforcamentos. Não por mim, claro que não. Nem
quero dizer que sinto vontade de me enforcar. Passei a vida inteira
"enforcado" e acho que já foi o bastante. De qualquer forma, sempre
senti um pouco de euforia ao tomar conhecimento de alguém que se enforcou. É só
uma coisa minha, nada demais. Perdoe-me aqueles que tiveram pessoas próximas
enforcadas - ou não perdoe - que se foda. A verdade é que respeito toda forma
de desistência. Tiros na têmpora, saltos de prédios e em frente a trens,
ingestão de veneno, inalação de gases e etc. Acho o ato de DESISTIR muito
corajoso, nem todos conseguem. Não acho covarde aquele que desiste, acho burro
aquele que continua insistindo em algo que não vai dar certo. Acredito que as
coisas podem dar certo assim como podem dar errado, sendo assim todos temos a
opção de continuar ou não e assim como todas as opiniões, esta também é
individual. E vamos combinar que a vida é uma merda e que nem todos temos
estômago para aguentar certos caprichos do destino, muito menos arcar com todas
as nossas medíocres ações.
Sendo assim,
nada mais que justo dar espaço para outra alma mais assertiva, que por ventura,
possa vir acampar por esse mundo. Contudo, a vida não se resume só em mazelas,
há também aqueles pequenos momentos onde nos sentimos o pica grossa no
universo, por exemplo, quando temos duas cabeças entre nossas pernas brigando
por um pedaço de nosso pau. Você nunca soube o que isso? Bom, se nunca, nessa miserável vida, pôde ter um momento como este, ainda lhe sobra o caminho da
Escada e a Corda, como diz Matanza.
Falando ainda
sobre aquelas pequenas coisas que trazem felicidade. Aqueles pequenos momentos
que enxergamos mais que os olhos humanos enxergam. Ao acordar no fim de semana
de folga e perceber que o sol está castigando a cabeça das pessoas e ao colocar
a cara para fora, logo você sente os pelos eriçados devido os raios solares
queimando de leve sua pele, parecendo ganhar mais potência, fruto do álcool que
transpira de seus poros quase a ponto de entrar em combustão. A felicidade que
propicia a primeira caneca de café depois do cigarro na garganta quase virgem
de uma noite mal dormida. A segunda caneca de café. E depois disso, poder abrir
a geladeira e encontrar uma garrafa geladinha, transpirando, deixando as pontas
dos dedos dormentes de tão gelada. Seguido de um Tissssss que dá água a boca. E
o primeiro gole, que faz formigar todo o interior e o céu da boca, quase
dormentes, a língua e a parede da bochecha. Isso é para poucos. O sabor, a
dormência, quase que de pau duro você agradece a semana inteira de sacrifício e
sacrilégios para poder ter estes pequenos momentos de felicidade puro e
simplesmente magníficos. É preciso muita consciência e inteligência para
saborear momentos como estes. Um gole, depois outro e outro e só parar para
acender outro cigarro. E sair no sol de novo e a pele estranhar novamente a
luz. E perceber que os cachorros também aproveitam o calor, deitados com a
barriga pra cima sob a luz solar, como quem faz fotossíntese, afinal, somos
todos adubos. Todos nós, não passamos de relés adubos para a terra. Sendo assim
eu poderia muito bem ficar aqui em minha cadeira de praia, curtindo o meu
sábado, olhando os bichos curtirem o sol e só me levantar para pegar outra
cerveja e mijar, que é inevitável. Contudo tenho uma garota nua em minha cama
que precisa ser alimentada. Precisa de energia para que possamos aproveitar o
fim de semana e terminar de desidratar-me. E também a ela. Então volto à penumbra
do quarto para vê-la nua, com o lençol caprichosamente cobrindo-lhe apenas
metade da bunda. E que BUNDA. Outro gole na cerveja e a metade da bunda e as
pernas de fora e o lençol, pensando; são sempre as pequenas coisas que me
agradam, não há definição melhor.
Melhor que
isso, só o caminho até o mercado, indo buscar mantimentos para o almoço,
tomando minha cerveja debaixo de um sol de dezoito infernos e meio, sentindo o
cheiro de liquido vaginal em meu volumoso bigode depois de chupá-la semi
acordada, pois não resisti àquela visão de bunda e pernas sobrando abaixo do
meu lençol.
Mas mesmo um
cheiro no bigode tem de ser interpretado. Eu interpreto de um jeito. Na fila do
mercado, feliz, com uma caixa de cerveja na mão e o cheiro de boceta no bigode
eu me sinto feliz como quem há muito não sente. E penso nas outras pessoas na
fila e mesmo aqueles que carregam suas caixas de cervejas, será que sentiam o
mesmo aroma que eu? E se sentiam, será que sabiam interpretar tamanho
significado e prazer que ali continha? E você que está lendo agora, será que
consegue?
Não adianta
querermos nos comunicar quando o ouvinte não se interessa pelo conteúdo da
mensagem. É preciso parar para ouvir. Duas pessoas conversando não
necessariamente quer dizer que estão se comunicando. Por vezes são apenas
palavras soltas como numa sopa de letrinhas, como num teste de ditado. Começar
o fim de semana com uma caixa de cerveja e o tal cheiro no bigode é sair
ganhando de goleada. Dito isso, espero ter sido compreendido.
Pois bem, eis
que volto pra casa com a sacola cheia de mantimentos suficientes para o preparo
de um bom Chilli de fazer a língua queimar. Mais um motivo para encharca-la de
cerveja e tudo corre muito bem, obrigado. Só que um ranzinza como eu não pode
levar a vida como se fosse um mar de rosas. Não eu.
Consigo me
desprender dos problemas quando estou com um Bourbon de qualidade no beiço e
meus cigarros a tiracolo enquanto ouço Howlin Wolf no rádio, mas sei que eles
estão lá guardados, só esperando para chegar segunda-feira e voltarem a me
atazanar. Mas e quando esses problemas não são suficientes? E quando eu,
acostumado ao limbo, à sarjeta, começo a pensar que a maré esta tranquila
demais e preciso de uma tempestade para me ferir e fazer pensar? Entendam;
sempre fui de viver à flor da pele. Não seria natural se eu simplesmente
sentasse em minha cadeira de balanço e começasse a planejar crianças, que por
sinal eu as odeio. Logo, vai eu enxergar defeitos e situações que me deixam
estressado e dignas de lamúria, pois tenho que reclamar.
Sendo assim o
ranger da cadeira de balanço me incomodava. O sol baixou e com o cair da noite
veio o frio e não demorou pra que eu começasse a praguejar. O Chilli não estava
apimentado suficiente, a cerveja ficou choca, o filme que íamos assistir me deu
tédio. O cabelo da minha garota não estava bom, seu micro pijama não me
excitava suficiente e assim veio mais praguejo. Praguejo atrás de praguejo.
Afinal, já disse, sou um ranzinza acostumado com o cheiro de merda nas narinas
e sempre fui adepto da teoria de que não se pode elogiar muito a sorte senão
ela acha que está bom e o abandona.
Bento
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