-
Doutor Quaresma
chegara ao seu escritório como fazia todos os dias. Deixou sua maleta 007 com
Cassandra e deu bom dia aos pacientes na recepção.
-
Cassandra. Na minha sala, por favor.
Cassandra, a
recepcionista seguiu o psicólogo até sua sala.
- A recepção
está cheia hoje Doutor.
- Pois
é. Como tem gente retardada nesse mundo. Todos eles esperando que eu posso
ajudá-los com uma palavra de conforto ou que mostre o caminho certo para eles.
Uns imbecis...
- Não
fala assim doutor, esqueceu que estou quase me formando?
- Mas eu
dou o maior apoio. Não tem jeito melhor de tirar dinheiro de idiotas do que a
psicologia. Claro, exceto se você for algum pastor ou político.
- Ou os
dois. Disse Cassandra.
Hahaha
- Anda.
Temos que ser rápidos.
Os dois riram e
Cassandra começou a tirar a roupa.
Quaresma abriu a
braguilha e Cassandra sentou em seu colo.
Dez minutos depois
Cassandra estava na recepção.
- Senhor
Carlos?
- Sim.
- Me
acompanhe por gentileza, o Doutor Quaresma vai atendê-lo.
- Ah sim.
Pois não.
Carlos então
acompanhou a recepcionista até a sala do psicólogo. A garota fechou a porta e
deixou os dois homens sozinhos.
- Olá,
bom dia. Como vai? O psicólogo
estendeu a mão para o paciente para cumprimenta-lo.
- Bem,
eu acho. Carlos respondeu.
-
Benedito Quaresma, muito prazer.
- Muito
prazer, Carlos Rodrigues.
-
Sente-se Carlos. Fique o mais à vontade que conseguir.
Carlos sentou-se numa
poltrona à frente do psicólogo. De veludo, macia e com suporte para os pés.
Muito confortável. Passou os olhos pela sala e pôde ver diplomas emoldurados
numa das paredes à sua frente e abaixo deles havia uma escrivaninha de madeira
maciça de cor escura. A sala não era muito bem iluminada. Quaresma estava de pé
à sua esquerda mexendo num gravador e ajeitando um bloco de anotações. Carlos
também pôde ver um pequeno bar do outro lado da sala, com garrafas de whisky e
outros destilados. Carlos conhecia todas aquelas marcas de bebidas, pois
ultimamente vinha abusando do álcool.
- Senhor
Carlos, o senhor fuma?
Quaresma estava agora
com uma cigarreira prateada com suas iniciais "BQ" impressas e apontava
para Carlos oferecendo-o cigarros.
- Posso?
Perguntou o paciente estendendo a mão para se servir de um cigarro.
- Fique
a vontade. Gosto de pacientes que fumam, pois assim posso fumar também.
- Um
vício maldito esse, não?
- Nenhum
vício é maldito, maldito é não tê-los.
Doutor Quaresma
finalmente sentou-se à frente de Carlos, repousou o gravador na mesinha de
centro e começou a fazer anotações em seu bloco de papel.
- Agora
senhor Carlos, quero que relaxe e saiba que tudo que me disser ficará restrito
a nós dois devido a confidencialidade entre psicólogo e paciente. Portanto,
fique tranquilo para me dizer o que quiser para que eu possa ajuda-lo da melhor
maneira possível. Você me entende?
- Claro.
- Vou
começar confirmando os dados da ficha que preencheu na recepção. Ok?
Carlos balançou a
cabeça confirmando.
Carlos Rodrigues, 29
anos, brasileiro, nasceu em São Paulo, solteiro e sem filhos. Profissão: assistente
de produção e escritor nas horas vagas. Fuma e bebe socialmente. Enquanto
Quaresma lia a ficha de Carlos ele passava mais uma vez os olhos pela sala sem
janelas e carpete cor de vinho. Quadros e algumas estatuetas faziam do ambiente
um lugar confortável, mas com ar arcaico. Perto do bar um objeto destoava de todas
as coisas velhas que tinha ali. Uma guitarra Les Paul vermelho sangue.
- Está
correto?
- Esse
sou eu.
- Ótimo.
Bem, vamos lá. O que te trouxe até meu humilde consultório, Carlos? Posso te
chamar só de Carlos?
- Sim.
Bom... É... Estou um pouco nervoso, me desculpe. Nunca fiz isso.
- Todos
ficam. Se quiser posso te servir uma bebida.
- Não
está muito cedo para beber?
- Melhor
cedo do que tarde não é?
Carlos sentia muita
confiança na forma de falar do psicólogo. Além da chupada na parte lateral de
seu pescoço e a braguilha aberta de sua calça social mais justa que o normal,
fazia Carlos ter quase certeza que ele dera uma rapidinha com a recepcionista
gostosa antes de atendê-lo. E pelo preço da consulta, as roupas caras, o
relógio europeu e a cara de ressaca que Quaresma apresentava, Carlos podia
jurar que a recepcionista não era a única vagina que o doutor tinha desfrutado
recentemente.
Quaresma apertou o
botão REC do gravador e foi até o bar. -
Whisky?
- Sem
gelo, por favor.
Benedito serviu duas
doses. Entregou o copo para Carlos e voltou a sentar-se.
- Então,
comece me dizendo o que você gosta de escrever.
- Em
geral eu escrevo romances policiais, mas meu primeiro trabalho não conquistou
muito a atenção das editoras.
- Por
qual motivo?
- Porque
disseram eles que havia muitos tiros e nenhum mistério.
-
Mistério é importante para um romance policial. Mas mortes me agradam muito se
quer saber Carlos. E como se sentiu com a rejeição?
- Nada
demais. Comecei a escrever outro agora com mais mistério.
- Ótimo
ótimo. Confiança é muito bom.
- É...
- E o
trabalho?
- Vai
bem, serei promovido em breve.
- Bom,
bom.
Quaresma continuava
fazendo anotações.
- Tem
namorada?
- Não.
-
Alguém?
- Bem,
tinha...
- E?
- Pois
é. É por isso que estou aqui.
- Então
me diz.
- Tem
uma garota...
- Qual o
nome dela?
-
Bárbara.
- Faz
jus ao nome?
- Sim.
Faz sim com certeza.
- E onde
ela está agora?
- Para
falar a verdade, não tenho a mínima ideia.
- Vocês
se veem com frequência?
- Mais
do que eu gostaria.
- Como
assim?
- Eu a
vejo em alguns lugares estranhos.
-
Desculpe, ainda não entendo. Quaresma deixou finalmente o bloco de anotações de
lado e bebeu um gole de seu whisky.
- É... É
estranho.
Carlos mostrou-se
desconfortável em sua poltrona. Também deu um gole em seu whisky e continuou.
- Eu não
sei quem é essa garota entende?
-
Explique melhor.
- Não me
lembro de onde a conheci. Não sei onde mora, não sei seu sobrenome. Eu
simplesmente a vejo em lugares estranhos e ela está sempre linda. Mas não tenho
certeza se as outras pessoas conseguem vê-la.
- Então
você acha que essa garota não existe?
- Não!
Sei que ela existe. Só não sei se ela existe para as outras pessoas.
- Hum,
interessante. Benedito voltou
a anotar. - Quando foi a primeira vez que
a viu?
- No
bar.
- E ela
estava sozinha?
- Sim.
- E
falou com ela?
- Na
verdade ela quem falou comigo.
- E como
foi?
- Foi
ótimo. Ela é engraçada, boca suja e bebe bastante. Sexy, linda...
- E você
se apaixonou?
- Sim.
Mas não sei... Talvez ela esteja na minha cabeça.
- Qual
foi a última vez que a viu?
- Ontem
de noite?
- E onde
estava ontem?
- Em
casa, bebendo sozinho até ela aparecer.
- E alguma
vez você a viu quando não estava bebendo?
- No
começo não.
- E
agora?
- Bem,
eu estou sempre bebendo.
- E você
não quer mais vê-la?
- Não.
- E se
parar de beber?
- Cara.
Eu sou escritor. Que espécie de escritor eu seria se parasse de beber?
- Você
está certo. E mesmo assim quer parar de vê-la?
- Sim.
Está me atrapalhando. Quero dizer, eu saio com outras garotas e tal. Mas sempre
que acontece ela aparece e fica me olhando e eu me sinto como se estivesse a
traindo.
- Você
diz quando está sozinho com uma garota no quarto e ela aparece assim, do nada?
- Isso.
- Bom,
eu acho que você é muito louco.
- Como? Carlos assustou-se com a afirmação do
psicólogo.
- Sim,
acho que você tá chapado. Um Zé Pinga que tá vendo uma mulher que não existe.
Doidão. Mas eu não te julgo. Eu gosto de tomar umas coisas pra ficar louco às
vezes.
Carlos não sabia o que
dizer. Já vira alguns filmes sobre psicólogos e nunca tinha visto nenhum falar
daquele jeito. Quaresma continuou.
- Eu no
seu lugar, se ela é gostosa como você diz, eu faria de tudo para continuar
vendo-a. Pense pelo lado bom. Uma garota que transa com você e some sem que
você precise ligar no dia seguinte? É quase a mulher perfeita. Mas se você quer
deixar de vê-la eu vou tentar te ajudar.
- É... Nunca
pensei desta forma. Mas não acho que seja saudável.
- Não.
Não é mesmo, mas eu não ligo muito pra isso. De qualquer forma... Eu poderia te
receitar algumas pílulas, porém, você não vai parar de beber e a mistura de
antidepressivos com álcool só vai piorar as coisas. Vamos tentar fazer isso de
uma forma não convencional.
- Como?
-
Mate-a!
- Matá-la? Carlos agora quase tinha certeza que aquele
doutor só podia estar louco. - Está
louco?
- Hahaha
não sou eu quem está vendo mulheres que não existem, Carlos.
Carlos calou-se.
- Preste
atenção. A Bárbara não existe, certo?
- Não
tenho certeza.
- Ora
homem. Se ela aparece no quarto enquanto você tá enrabando uma garota qualquer,
ou ela é uma ladra que te segue por aí - o que seria melhor ainda - ou um
fantasma - e eu não acredito em fantasmas - ou ela está dentro da sua cabeça.
Portanto, se matá-la, você estará matando uma coisa que não existe.
- É.
Pensando desta forma...
Quaresma então tomou
seu último gole de whisky, olhou o relógio e com um sorriso satisfeito no rosto
disse para Carlos voltar na próxima semana para dizer como foi.
- Acabou
o tempo Carlos. Faça isso e volte semana que vem para me dizer como foi.
Cassandra marcará um horário pra você.
- Ok.
Obrigado pelo whisky.
- Não
agradeça. Até logo.
***
No mesmo dia, Carlos
marcou um encontro com Bárbara, em seu apartamento. Na verdade não tinha como contatá-la,
sem celular, sem endereço, no entanto sabia que toda vez que estava sozinho e
começava beber conhaque, sozinho e ouvindo música, ela aparecia. Colocou todos
os seus vinis antigos e nada da Bárbara aparecer. Estava quase no fim da
garrafa e caso ela chegasse ao seu fim ele teria de sair e ir até o posto de
gasolina mais próximo para buscar algo mais forte para ficar bêbado e
finalmente ver Bárbara. A garrafa acabou e lembrou-se que tinha um pouco de
erva numa das gavetas do armário da cozinha. Assim enrolou um cigarro de
maconha e decidiu fumar para ver se obtinha sucesso e nada da Bárbara aparecer.
- Parece
que ela está prevendo, porra!
Parecia que ela estava
prevendo. Carlos fumou o cigarro, ficou sonolento, mole, quase dormindo. Porém
sabia que não podia dormir. Aquilo teria de acabar naquele dia. Resolveu
levantar-se do sofá e ir até o posto buscar uma garrafa de vodca. Sabia que com
vodca era quase certeza que Bárbara apareceria. Voltou ao apartamento, abriu a
garrafa e serviu-se de um copo longo de chope cheio de vodca. Virou o primeiro
com dificuldade. Quase gorfou, mas conseguiu se segurar. Serviu outro e esse
bebeu devagar.
Depois de algum tempo
bebendo e ouvindo música finalmente Bárbara apareceu.
- Você
sequer me citou em seu último texto...
-
Desculpe. Mas foi um texto encomendado. Por mim eu só escreveria sobre você.
- Hahaha
mentiroso. Estava me esperando?
- Desde
cedo. Você demorou!
-
Desculpe. Estava bebendo com uns amigos.
- Venha
aqui. Sente-se. Quer vodca?
- Não
sei. Estou meio bêbada.
- Ah
venha. Só um pouco...
- Ok.
Os dois beberam
durante mais algum tempo e conversaram sobre futilidades.
Carlos confessou-lhe
que fora ao psicólogo para entender a relação dos dois.
- E o
que ele disse?
- Me deu
força. Disse que se eu gosto de você então que leve isso pra frente. Inventou Carlos.
Os dois já estavam um
pouco sonolento quando Carlos decidiu usar a almofada do sofá da sala para
agredir Bárbara. Com a almofada pressionada com muita força no rosto de Bárbara
tentava fazê-la perder o ar. A garota debatia-se e tentava gritar, porém o som
era abafado pela almofada. Carlos manteve a almofada pressionada com força
depois mesmo da garota parar de se debater e tentar gritar. Para ter certeza de que tinha obtido sucesso.