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Está todo mundo indo
para casa, parece. Tudo é cheio. Hora do rush tudo é cheio.
Quando você está
prestes a deixar um lugar durante muito tempo parece que todos te reparam. E
você repara em todo mundo.
Cheguei na sala de
aula e não havia ninguém. Peguei um café e comecei a ler meu livro. Estava
quase no fim, era um livro fino. Pena. O livro era bom.
No meio da leitura
começou me dar um desassossego. Não! Não era essa a palavra. Era desespero
mesmo. Tanto que me perguntei: "O que exatamente eu to fazendo aqui?”.
Já tinha sentido isso
antes e fui ver a mostra do Raul numa estação de metrô.
Voltei no dia
seguinte. Só que desta vez era diferente, não sei bem. Queria sair dali, era só
isso que eu queria.
Eu comecei a pensar no
quanto de dinheiro estava gastando com aquilo e percebi que não tinha a
quantia. Um dinheiro que eu não tinha. Era isso! A conta não fechava.
Olhei em volta e os
outros alunos começaram a chegar e me cumprimentar. "boa noite, boa
noite", é segunda-feira, o que tem de bom? Quero meu quarto, meus textos e
um trago.
Escrever é o que eu
queria, porra!
Mas escrever não me
dava dinheiro e aquela sala roubava meu dinheiro. Ou tomava seja a palavra
certa, tanto faz.
Escrever não paga nem
o cigarro, por isso tenho de trabalhar. Estudar não estava melhorando minha
escrita, pelo contrário.
Estudar consumia meu
dinheiro e atrapalhava a escrita. Aí pensei: "vou sair daqui" e
parece que as pessoas reparam mais em você quando se está partindo.
Isso é uma merda. Dei
uma última olhada nos outros alunos e parti. Ao descer as escadas encontrei
todo o resto dos alunos perguntando onde eu ia. "Aonde vai? Aonde
vai?" Foda-se onde vou. Não disse, mas poderia.
Mas eu sou dramático.
Foi uma saída à francesa, como se fosse um adeus final. Não era nada disso,
volto, ainda volto. Quando não sei, nem sei se volto, posso morrer amanhã.
Pretendo voltar. Preciso me despedir do bar também, mas não hoje, um dia venho
só para isso. Enquanto isso, vou. Preciso desafogar.
As contas precisam
fechar, caso contrário, não estudo, não escrevo, só penso em contas. Simples
assim.
Mas escrever é o que
me dá mais prazer. Não preciso de mais nada, escrevo e pronto. Uns tragos,
cigarros e algo para matar a fome e é só. Estudo só para poder viver da
escrita, quem vai querer ler um cara que só escreve? Só um cara? Quem é esse
cara? Não, tem que ter mais alguma coisa.
Sempre vi nesse tempo
todo no bar uns mauricinhos que têm seus estudos pagos pelos pais passando o
ano todo sentado na mesa do boteco reclamando da vida e do atraso nas matérias.
Claro, ficam sempre no bar. Veja, não sou santo, também matei meia dúzia de
aulas pelo bar. E daí? Não vou reclamar. Se não posso, não faço. Desistir de
lutar é uma coisa. Insistir em tomar soco de um valentão com o triplo de seu
tamanho e peso é burrice. A vida ensina, não tem atalho. Não para um tipo como
eu.
Curioso é que escrever
tem sido melhor até que transar. Prefiro.
Se dissesse isso há
dez anos daria risada na minha própria cara e diria: "tá louco!" Sim!
Quem não está louco está morto, acha que está vivo, mas está morto. Mortinho da
Silva.
Reflito para ver se é
isso mesmo e não tenho dúvidas, prefiro mesmo.
Escrever me faz bem,
toma tempo, só que bem pouco. Não me custa nada e não tenho de ouvir
reclamações do teclado me perguntando se vou ligar no dia seguinte. Ligo, eu
sempre ligo, nem que seja para dizer: "vamos ser amigos, ok?"
Prefiro transar com as
palavras porque tem sido mais prazeroso. Sou meio de fase, minha fase hoje é
aquela de exclusão, não sei o que é. Com raríssimas exceções eu preferia me
excluir.
Quando se passa muito
tempo sozinho como eu você aprende a dar valor a quem te faz companhia e não
cede seu tempo para qualquer pessoa. Você se acostuma e fica exigente ao mesmo
tempo. Traduzindo: UM CHATO! Mas é isso que eu sou, um velho chato. Mas é isso
que eu sou. Paciência.
Então repenso e não
tenho dúvidas, escrever tem sido melhor que transar.
Faço isso só, a hora
que eu quiser e quando não quero ligo a TV para matar o tempo. Tomo uns tragos,
fumo, mato o tempo. É isso que eu faço e não ganho um puto para isso. Fazer o
quê? Vivo disso, salvo a alma pelo menos. Salvo a alma enquanto ainda vivo,
depois de morto que se foda.
Bento.
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