Quando eu falei sobre bunda no conto "Valorizemos as Nádegas Que Temos Em Casa" talvez tenha passado a impressão errada.
Talvez tenha dado a entender de que eu, como todo brasileiro, seja um aficionado por bundas.
Ninguém esconde isso. As crianças nascem mamando nos seios mas crescem admirando bundas.
Os velhos tropeçam em suas muletas nas ruas olhando para as bundas das jovens garotas que desfilam nas calçadas do verão de minissaias e microvestidos.
Vejam os programas de auditório cheios de bundas flutuantes dançando conforme a música e as câmeras com seus close-up para não perder nenhum movimento.
O carnaval só existe pela bunda das mulatas.
A calça legging só existe por causa das bundas e o homem, ora o homem. O homem como conhecemos hoje só existe por causa da bunda.
Eu tinha um amigo -- e digo tinha, pois perdemos contato-- que jogava pôquer na praça Sílvio Romero, toda tarde eu, ele e mais outros amigos passávamos as tardes jogando, apostando e olhando para as bundas passantes. Esse meu amigo costumava dizer "homem só atura a mulher por causa da bunda" e de princípio eu não entendi o que ele queria dizer, afinal, a mulher também não existe sem a bunda.
Então ele me explicou que era exatamente isso, "se o homem pudesse separar a bunda da mulher o homem se casaria com a bunda e não com a mulher". Pensem no constrangimento de apresentar uma bunda aos amigos, pensem no problema que seria em chamar a bunda para o almoço de domingo com os pais.
Eu lembrei desse meu amigo para falar de uma colega de trabalho que claro, é mais bunda que colega. Não me entendam mal, não quero aqui dizer que essa tal colega se resume somente à nádegas. Não, ela também tinha uma voz irritante e um rosto que na verdade não trazia sorriso nem ao mais míope, ou ao mais virgem dos homens. Sendo assim, o que vale ser exaltado quando se trata da tal colega de trabalho é somente a bunda. Mesmo.
Olhando assim, superficialmente, para não dizer que eu passo mais que meia hora olhando para aquela bunda, passei a acreditar que era uma bunda obesa. Uma bunda gorda. Não, a moça não é gorda, nem de longe. A moça tem um corpo de brasileira de praia, de academia, coisa de bailarina de programa de auditório, um pouco menos um pouco mais, mesmo assim, um bom corpo, para quem gosta de carne... Mas mesmo para um homem estranho como eu, que prefere ossos e seios, ao invés de bunda e carne, mesmo assim, chama atenção. Também pudera, é uma bunda de um colesterol nas alturas, uma bunda de bandejão, é tão somente a bunda roliça de perturbar os olhos dos cegos. Mas não é só uma bunda gorda e obesa como eu disse, é uma bunda viva.
Talvez a bunda seja a moça, não a moça seja a bunda.
Éramos eu e a bunda nos encarando e eu perdi naquela batalha. "Mexa com alguém do seu tamanho!" eu disse. Não disse, mas não faltou vontade. A bunda, no meu preconceito irremediável, deveria ter o nome de Alaor, pois acho que todo gordo deve-se chamar Alaor, assim como todo Valdir deve ter bigode, mas em minha cabeça, chamar aquela bunda de Alaor não seria justo, nem com a bunda, nem com o Alaor. Muito menos para mim que ficaria broxado com a comparação.
Fico eu pensando para quem são direcionados os "bom dia" quando ela chega ao trabalho, se para a bunda ou para moça. A bunda é de uma personalidade que deseja sempre ser vista pelas costas, sem abalo, e nós fazemos sem consciência. E sem pesar na consciência.
Dito isso me peguei pensando, o que seria do homem sem a bunda? Eu particularmente, se tiver que optar, ainda prefiro seios.
Bento.
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