domingo, 29 de abril de 2012

GIULIARD BORSANDI III

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Indica-se ler o capítulo anterior "GIULIARD BORSANDI II" 



Eis que acordo pela manhã com a campainha estourado meus tímpanos que mais parecia uma cabra sendo estuprada por um caipira. Por um breve momento achei que era um sonho, infelizmente não era. Acordei assustado e percebi que a chuva tinha partido e agora restava um sol de dar inveja a qualquer verão, apesar de estarmos no outono, tanto que acordei ensopado como na noite passada, só que desta vez não era por causa do banho de chuva, era suor causado pelo sol que batia na minha cara. E a campainha disparando o berro da cabra.

Eu tenho um 38. colado com fita adesiva debaixo da escrivaninha por precaução que nunca fora usado, contudo quando se é um delator, um cagueta como eu, as pessoas tendem a não ter muita simpatia. Quando comprei o ferro do mané do Cabelo imaginei momentos como esse que eu acordaria de surpresa e imediatamente ergueria a arma apontando-a por todo o escritório como nos filmes da máfia, mas nunca tive esse cacoete de policial. Só fui lembrar da arma quando já estava em pé com a mão na maçaneta da porta.

Por falar em Cabelo, eu molhava a mão dele sempre que entrava algum dinheiro para que ele me avisasse quando estivesse subindo alguém para meu escritório, afinal o prédio era bem antigo e não possuía nenhum sistema de segurança como câmeras e etc. Tão antigo que não me surpreenderia se dissessem que Dom Pedro II tivesse usado um dos apartamentos para trepar com alguma puta do império.

Cabelo não era bem um funcionário do prédio, na verdade, não havia nenhum funcionário lá, ele era mais um passador de drogas típico de um país de terceiro mundo, boné aba reta da CBF, camisa polo listada e Nike no pé, fora as correntes douradas no pescoço e nos braços que ele costumava balançar como aquele personagem de uma novela antiga. Era garoto ainda, deveria ter feito dezoito recentemente e chamavam-no de Cabelo pelo Black Power que escondia dentro do boné. O garoto usava a portaria como ponto, boca, chamem como quiser.

Porém, fazia tempo que não entrava nenhum dinheiro e consequentemente havia tempo que Cabelo não recebia nem uma moeda.

Finalmente abri a porta e quase coloquei para fora todo o café que ainda não tinha tomado. Era Nelia que disparava a campainha do meu escritório como uma desesperada. E ela estava linda, definitivamente linda. Abri a porta e ela me recepcionou com seu sorriso branquíssimo e dentes perfeitos de menina rica que vai ao dentista uma vez por semana. Ao contrário dos meus dentes amarelos de fumante e tortos de quem só foi saber o que era dentista aos dezoito anos e foi no primeiro ano de faculdade, quando houve uma campanha gratuita feitas pelos estudantes de odontologia.

O fato é que aquele sorriso, aquele olhar de superioridade (ela fora a única que conseguiu me colocar na linha), aquele rosto perfeito e branco como o sorriso, me deixava de perna mole, me tirava qualquer problema da cabeça e eu ia do céu ao inferno em questão de segundos. Ainda havia o decote, eu era louco por aquele decote. Nunca vi seios tão perfeitos apontando para minha cara, seios nem grandes nem pequenos, mas proporcionais para seu corpo magro, os mamilos rosados como chiclete, Nelia era a mulher da minha vida do dedo do pé até seus cabelos lisos e negros.
Eu já estava de pau duro pensando naqueles peitos, muito devido ao fato de ter acabado de acordar. Incrível como acordo com um tesão de garoto de quinze anos, quando Nelia interrompeu minha viagem à terra dos seios. "Você não vai me convidar para entrar?" ela disse com sua voz de anos de aulas de canto.

Não sei, depende do que você veio fazer aqui - eu respondi fingindo não estar nem aí para a visita dela. Só que na verdade eu desejava vê-la a cada minuto do meu dia. Em cada corpo de mulher que minha língua passeava eu imaginava ser o dela, imaginava sua língua em cada boca que eu beijava e adicionava mentalmente as pintas do corpo de Nelia, cada uma, nos corpos de todas as minhas amantes.

Então a mulher dos meus sonhos me respondeu com o mesmo sorriso dizendo "estava com saudade" e antes que eu pudesse por em prática toda a minha estupidez, toda minha aspereza, ela pôs a mão em minha nuca e meteu a sua língua macia na minha boca. Agora meu pau não estava só duro, latejava dentro da minha calça como um cão que late para o carteiro.

***

Foi quando eu ouvi a campainha novamente e agora eu estava de volta na cadeira, todo ensopado de suor com o sol batendo na minha cara. Era um sonho, só um sonho ou, mais um sonho. Eu já deveria saber que se tratava de mais um sonho que tinha com Nelia, pois eles eram diários, não importava quantas vezes eu dormisse, todas as vezes sonhava com Nelia. Como eu sou idiota.

Levantei-me para abrir a porta e percebi que a única coisa real no sonho era o pau duro. Arrumei o “menino” dentro da calça de forma que ninguém percebesse o volume e até que deu certo. Lembrei da arma, coloquei o 38. na parte de trás da calça e fui ver quem dava dedadas na cabra que eu chamava de campainha.

Era um amigo de muito tempo atrás...


Bento.

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quinta-feira, 26 de abril de 2012

DESINTERESSANTE (Eu não perderia meu tempo lendo)

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Eu sou um cara estranho. Só um cara.
Porém estranho. Porra! Muito.
Antes não, eu já fui um Zé Roela como a maioria, principalmente os da minha idade. Com quase vinte cinco, ou o cara é um pai fodido de dívida ou é um meninão. Quando digo "meninão" quero dizer àqueles inúteis que não saíram da adolescência.

Eu sou um rabugento, um ranzinza. Poucas coisas me agradam.
Tem também esse tédio que não me deixa. Tanto tédio que essa semana, como podem ver, não consigo escrever sobre outra coisa, só tédio.
Tédio, saco-cheio, reclamação. Tudo um saco. De um mau humor desenfreado, preocupante eu diria caso não fosse eu.
Criei um personagem, o Giuliard e até ele é mal humorado. Veja minha situação.
Tudo me parece tão desinteressante.

Sento em frente à TV e zapeio, zapeio e nada. Um ou dois seriados que tem hora marcada.
O jornal parece sempre de ontem, apenas as mesmas notícias do ano passado. Só o futebol muda um pouco, nem sempre. Já as entrevistas dos jogadores são as mesmas. Robôs sem cérebros. Também, não precisam, são ricos.

Tudo desinteressante, tão desinteressante. As coisas podem ter graça para as outras pessoas, torço para que tenham. Mas como eu disse: sou um velho ranzinza. Mas prefiro ser um ranzinza que um Zé Roela.

Nessa chatice medíocre que me encontro só vejo graça em escrever, nunca escrevi tanto, mas desconfio da qualidade em tudo que é em grande quantidade. Escrevo tanto por causa do tédio. Todos chatos.

Nem vou falar das pessoas. Se falar não acabo hoje. Seria um seriado sobre pessoas tediosas, chatas e medíocres.
Mas alguém tem que ser interessante, alguém tem que me fazer rir de coisas tolas nem que seja só às vezes. Tem a garota das flores, ela parece ser interessante, mas só o tempo irá dizer.
E corro o risco de não parecer interessante também. Sempre existe esse risco.

Beber ainda me faz rir de coisas tolas. E é o que vou fazer agora.


Bento.

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SÃO SÓ DETALHES

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Esses dias eu tive que ligar para uma senhora e me atendeu um cara. Com esse "cara" quis dizer jovem. Mas não gosto de usar o termo "jovem", é antigo demais.
A tal senhora não estava, então agradeci e disse que retornava depois e do outro lado da linha recebi um "disponha". Disponha?
Desliguei o telefone e fiquei pensando. As pessoas não falam mais assim hoje em dia. Disponha. Os jovens... Quer dizer, os caras não falam mais assim nos dias de hoje.

Ganhamos um pouco em liberdade, em modernidade, mas perdemos em educação. Falei do metrô outro dia, ninguém é gentil mais com o próximo.
Direitos e deveres só ficam no papel.
Aquele cavalheirismo que vemos em comédias românticas clássicas perdem-se no meio de sátiras e piadas de mau gosto.

Conversando com minha mãe em alguns raros momentos de descontração ela me leva ao passado contando histórias sobre seus namoros na adolescência e comparamos com os dias de hoje quando conto as histórias da minha adolescência.
Realmente o futuro é sempre mais castigado, relaxado. Ninguém faz questão de impressionar.

Eu, como sabem, sou um romântico incurável -- adoro dizer isso, pois é verdade --, mesmo assim, não pense que vou ficar romantizando com qualquer cretina que aparecer no meu caminho. Existe quem merece e quem não merece.
Conheci uma garota que merece, aí mandei flores, na verdade não a conheço ainda, nos falamos... Conhecer vem com o tempo. Quem sabe?
Aí mandei flores, coisa que tempos atrás era comum, não hoje.

As pessoas têm medo de entrar em floriculturas, os jovens, os caras. É só uma loja de flores. Não sei como esse comércio sobrevive ao capitalismo se as pessoas tem receio de comprar seus produtos.
Quando fui escolher as flores, perguntaram: Mas você vai na floricultura? Espantados. Como se eu fosse numa casa mal assombrada. Respondi: No açougue é que não poderia ser. Certo? As pessoas mandam chocolates, mas não flores. Nunca vou entender isso.

No entanto eu fico feliz de ter esse espasmo de clarividência. A maioria das pessoas não enxergam, vivem andando e andando e não olham em volta, passam pelos detalhes como água pelos dedos. O cigarro me ajuda com isso, acendo um cigarro e relaxo prestando atenção nos detalhes. Nunca poderia fazer isso como não fumante, ninguém para no meio da rua por nada senão para fumar. Paciência.

Só sei que a beleza que eu vejo, nem todos veem. É a beleza dos mínimos detalhes. A beleza está nos detalhes, sempre esteve. É só reparar.


Bento.

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quarta-feira, 25 de abril de 2012

A MORTE DA BEZERRA

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Dias nublados sempre me deprimem e pedem para que eu fique em casa escrevendo. É como medo do escuro, nojo de barata e dia religioso. Nublou, minha cama fala comigo: Psiu! Volte a deitar.
Não é só preguiça.

Então levanto e vou trabalhar, claro. Preciso ganhar dinheiro, pois escrever não paga meus cigarros. Curioso que ultimamente o fato de não ganhar nada para escrever tem me afetado mais que antes. Quer dizer, nunca me afetou, mas de uns tempos para cá...

E me perguntam: vai ficar em casa sozinho? Evidente. Com quem mais?
Quanto menos melhor. Às vezes só o que preciso é lidar com o silêncio. Ou mais que isso, é colocar os pensamentos em ordem, fazer o que bem quiser. Talvez eu tenha me tornado antissocial, se é que isso existe. Porém não me vejo aturando uma imbecil do meu lado só para dizer que tenho companhia. As coisas não são tão simples quando se é sincero como eu.

No caminho para o trabalho começo a pensar sobre isso, olho as garotas que passam e me pergunto sobre o que elas pensam? Funk? Um sapato novo? Na morte da bezerra? Não, obrigado.

Conheci uma garota um tempo atrás e ela tinha uma bela bunda. Mais que isso eu estaria exagerando. E o que eu iria fazer? Não posso conversar com uma bunda, contar piadas para uma bunda. Posso abraçar, até beijar uma bunda, mas o que eu faço, levo a bunda para jantar? Não, obrigado de novo.

Existem coisas maiores nesse mundo. Vejam meu caso, estou num metrô lotado, absurdamente lotado, me contorcendo para continuar escrevendo esse texto que vou publicar sabe Deus quando.
As pessoas estão todas estressadas e eu não sou diferente. Gosto muito do silêncio e do vazio para me animar com um cenário desses.
É um ambiente típico de terceiro mundo e nessas situações não existem cidadania nem gentileza. É cada um por si numa corrida para o trabalho e quem chegar no horário vence. Eu mantenho o equilíbrio graças aos fones de ouvido, mas no tumulto do entra e sai dos vagões eu agradeço por proibirem o porte de armas.

Agora basta. Não gosto de falar sobre isso, afinal, não vai mudar, as pessoas não mudam. São todos como a bunda. Andam, falam, até se excitam, mas não pensam.
Se pensam, é somente no Funk, no sapato novo e na morte da bezerra.


Bento.

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segunda-feira, 23 de abril de 2012

PROMESSAS DE FIM DE SEMANA

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Odeio começar escrever de segunda-feira porque sempre me faz lembrar que deixei algo passar no fim de semana.
Faz algum tempo eu planejo tirar um bom fim de semana inteiro, daqueles com chuva, para tomar um trago e passar o dia escrevendo. Faz tempo e nunca cumpro.
Nunca cumpro o que planejo porque sempre tem uma festa, um bar, aí estou sempre curando-me de uma ressaca e só tenho vontade de dormir e ver filmes que só alimentam meu vício em entretenimento.

Uma vez falei das qualidades psíquicas da ressaca, parei nisso, não queria falar dos efeitos físicos dela, romantizei até o último, mas agora vou deixar claro: Ressaca é uma merda. Uma bosta. Tente trabalhar de ressaca e verá que é ridículo, seu cérebro não funciona, seus membros tremem e seus olhos suplicam para se fecharem e mandam você dormir. VAI DORMIR. Quero folga! Eles dizem. Escrever de ressaca é excelente, trabalhar não.

Bem, eu tenho que trabalhar, não ganho um puto escrevendo. Não paga nem os cigarros, logo é melhor trabalhar para ter o que beber e o que escrever.

Quando não é a ressaca são os trabalhos e provas da faculdade de jornalismo que me consomem as forças e o tempo. Sendo assim, continuo sem cumprir minha própria promessa de reservar um fim de semana para tomar uns tragos, fumar e escrever.
Eu não consigo cumprir minhas próprias promessas. Que ponto eu cheguei?

Esse fim de semana não bebi, tomei uma ou duas cervejas, mas isso é nulo. Meu fígado bebe duas ou três cervejas e acha que é xarope para gripe. Só vai se dá conta que está bebendo quando passo de uma dúzia, aí ele grita: FESTA!
Eu gostaria de ser um fígado, sempre bêbado, armazena álcool para a época de estiagem, sábio fígado. Eu não. Não consigo guardar uma garrafa de nada alcoólico. Se estiver à vista eu bebo e escrevo, escrevo e bebo. E por aí segue.

Esse fim de semana não bebi. Sábado eu fui ao shopping e lembrei do porque não gosto de shopping.
Um monte de velhos, casais e casais de velhos andando como se não houvesse um amanhã. Andam e se esquecem das horas e dos dias. Nunca se perguntou porquê shoppings não tem relógio? Não querem que você saiba as horas.
Eu tenho pressa, ando como se estivesse fugindo de alguma coisa. Da morte talvez, ando como se fosse semicorrer. E aquela lentidão dos velhos, dos casais e dos casais de velhos me mata.

Quando namorava eu ia ao shopping. Achava um saco, mas ia. Mulher no shopping é quase como velho no médico. Só sai de lá quando acha alguma coisa que serve. E isso leva tempo.

Sai de casa no sábado e já pensava quando voltaria. Era um sábado de frio, odeio o frio e quero dormir e ver filmes engraçados, ou de ação. Ou seriados engraçados de ação. Queria voltar para a cama e colocar minha calça de moletom no momento em que saí de casa, mas tive que ir ao shopping comprar um presente para o aniversário da minha irmã.

Já o domingo eu dormi. Dormi até os ossos doerem. Foi um bom domingo apesar do resultado no futebol, passei quase o domingo inteiro falando com uma garota. Exceto quando estava dormindo, vendo o jogo ou comendo, falava com a garota. Foi uma conversa legal, divertida. Comecei pisando em ovos como todo homem faz quando fala com uma garota absurdamente linda pela primeira vez.
Pisamos em ovos com medo de falarmos alguma merda, pois homem é o campeão em falar merda quando conversa com uma garota absurdamente linda pela primeira vez. E eu não sou diferente. Algumas raras exceções acertamos na dose. Espero ter sido uma dessas vezes.

Então ficamos eu, meu moletom e a garota conversando. Meu irmão me trazia cervejas e eu não queria, mas não negava. Também, cinco ou seis cervejas não fariam mal algum. Tanto faz.

E assim foi o domingo, me despedi da garota e fui dormir.

Fim de semana que vem eu vou reservar para tomar uns tragos, fumar e escrever. Quem sabe falar mais com a garota...


Bento.

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domingo, 22 de abril de 2012

GIULIARD BORSANDI (CÁPITULO II)

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Estou pendurado numa janela de um hotel barato no centro de São Paulo, num beco cheio de lixo, ratos, gatos e mendigos.

Eu estou disfarçado de mendigo para passar despercebido, mas também, com meu salário e minhas roupas, nem precisei fazer muito esforço.

As únicas coisas que me diferenciam de um morador de rua são o cheiro e a máquina fotográfica no pescoço.
Eu sou investigador particular e me chamo Giuliard Borsandi e fui pago para tirar algumas fotos da esposa de um pastor, que ele desconfia estar trepando com um tal de obreiro, seja lá o que for isso.

Veja que nem em mulher de pastor pode-se confiar mais. O mundo acabou e esqueceram de jogar terra em cima.
Mas a tal serva de Deus é esperta, escolhe sempre hotéis verticais, sempre acima do quarto andar, com janelas e cortinas fechadas. Desta vez ela só esqueceu de conferir a altura do galpão abandonado ao lado. Foi difícil escalar, mas aqui estou.
Arriscando minha vida por uma merreca que mal paga os cigarros do mês. E tudo isso no anonimato, digo, para quem tinha tudo para se tornar um jornalista investigativo famoso e digno de prêmio, eu me perdi em algum lugar.

Sei que já contei minha história para vocês (Apresentando: Giuliard Borsandi. Mini série), no entanto para quem não sabe, eu sou um ex-jornalista que espanquei o cara que roubou minha promoção e minha noiva. Na verdade não espanquei, foram três socos bem dados que o fizeram falar fofo durante um bom tempo, mas não chegou a ser espancamento. De qualquer forma, tanto faz, mas deve ser verdade, afinal dizem que tudo que está no jornal é verdade.

Então já passou da uma da manhã e essa vaca não me dá uma brecha para uma foto. Eu poderia dizer ao pastor que a mulher é uma santa e acabar com esse sofrimento, porém quero preservar um mínimo de vergonha na porra dessa minha cara. E com meu passado de ter sido trocado por um amolfadinha punheteiro comedor de puta - tomara que pegue uma sífilis, é o que desejo para Nelia - é minha obrigação defender os fracos e oprimidos por mulheres vadias. Longe de mim querer ser um herói, não me entendam mal, eu sequer consigo pagar minhas contas e fazer a barba.

Meu pau não vê duas pernas abertas vai fazer um mês e eu nem sei o nome da última fulana que comi em cima da escrivaninha do escritório. Só sei que ela era boa, muito boa. Ela foi me procurar para pegar o marido rico trepando com a empregada, parecia que eles tinham um contrato de casamento que no caso de adultério o traído ficaria com tudo.
Vagina cara dessa empregadinha. Também, até eu gostaria de pegá-la por trás como fez o tal marido rico. Dava dó de deixar aquela moreninha sem uma bela chupada.
Só que homem é burro pra cacete, se a carne é fraca amigo, não assine contratos. Esse é um lema que eu vou levar para minha vida.

Magali! Lembrei o nome da madame que me contratou, não era de se jogar fora, é bem verdade que não era bonita, o dinheiro ajudava muito.
Cheirosa, tão cheirosa que toda vez que ela entrava no meu escritório seu perfume ficava lá por dias. Na verdade chegava a me irritar aquele perfume, muito doce, não gosto de perfumes doces, porém com o tempo me acostumei. É bom sentir algo de feminino naquele cubículo nojento que chamo de escritório. Seis metros quadrados com uma janela, uma porta, uma mesa e um arquivo. E só.
Magali me tirou o atraso, mas agora já tava na hora de correr atrás do prejuízo de novo.

Bom, a crente do diabo fugiu novamente e eu fui para o escritório. Abri a garrafa de scotch tupiniquim e a primeira dose foi num gole só. Sentia frio com aquelas roupas molhadas devido a chuva de verão. Peguei uma trouxa de roupa seca que havia numa mala ao lado do arquivo, preparada exclusivamente para essas ocasiões, troquei-as e me joguei na cadeira e esticar as pernas sobre a mesa. Abri a gaveta onde guardo os destilados e servi mais uma dose, dessa vez dupla. A gaveta da escrivaninha que sempre emperra, precisou de um leve soco de baixo para cima para ela deslizar suavemente. Acendo um cigarro e dou um trago demorado, "dia difícil" penso em voz alta. Giro o dial do pequeno rádio de pilha e acho uma introdução de guitarras que agrada meus ouvidos e fico ali pensando se a mulher do pastor vai me passar para trás novamente na próxima emboscada. De qualquer forma, a adultera só sai para vadiar quando o pastor viaja, o que só vai acontecer na próxima sexta-feira, logo, terei quase uma semana para preparar um novo plano.

Acendo outro cigarro e fico olhando a chuva pela janela do escritório, vejo que algumas gotas passam pelo pedaço de papelão improvisado num quadrado que antes tinha um vidro que fora quebrado por uma pedra, "precisa de mais fita" pensei comigo.

Então peguei no sono. Estava cansado e não era só fisicamente.

Eis que acordo pela manhã com a campainha que mais parecia uma cabra sendo estuprada por um caipira.

Era uma amiga de muito tempo atrás...


Bento.

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PARECE CLICHÊ

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Parece clichê.
Sei que isso é um tiro no pé, um antisserviço contra minha própria escrita.
Começar um texto com a palavra "clichê" é isso. Um tiro pela culatra.
Digo isso, pois, ninguém gosta de clichês, na verdade, logo eu corro o risco de não ter um leitor sequer. Na verdade, todos gostamos de clichês, mas pensamos não gostar, dizemos a nós mesmos que não gostamos, mas gostamos. Músicas clichês, cantadas clichês, roupas clichês. Se perguntar, ninguém gosta de clichê.
Então, quando eu assumo logo na primeira linha do texto que trata-se de um clichê, as pessoas se assustam. Paciência.

Vamos então ao clichê em questão.
Tenho um conhecido, uma amizade recente eu quero dizer, que pode se tornar amigo ou não, o tempo vai dizer.
Esse conhecido chama-se Rubens. Este é um tipo Bon Vivant, vive a beber, fumar e fazer sexo com inúmeras garotas.

E logo as pessoas o rotulam de todos os nomes possíveis que caracterizam seus atos como canalha, cafajestes, galinha, só para citar os mais comuns.

Eu mesmo um dia desses falava ao Rubens: Reclamas do que Rubens? Todos por aqui o invejam pela vida que leva.

E Rubens me respondeu com seu sorriso de diabo que me fez entender. Primeiro vou falar do tal "sorriso de diabo". Existem sorrisos espontâneos, tem aquele sorriso de quando vemos uma criança acenando para nós, o sorriso amarelo quando somos pegos na arte. Sorriso do diabo é um sorriso que não emite felicidade, emite desespero. Emite solidão e desesperança.
Neste sorriso só sorri os dentes e a boca, os olhos não.

Claro que eu só fui perceber a diferença do seu sorriso quando Rubens me contou.
Contou que todos adoravam a vida que ele levava, menos ele. Todos queriam parte do que ele vivia, menos ele.
Rubens então com os olhos marejados dizia viver a procura de algo que ele, em algum momento, no meio do caminho esquecera o que era.

Ele continuou então sua história revelando a existência de um ex-amor. Ele deu esse nome, mas não sabia se era ex, ou se era amor. Então o amor se foi e ficaram as sobras. Sobras estas que ele tratou de tentar afogá-las com álcool sem sucesso. Tentou matá-las com sexo, muito sexo e não via méritos nisso.

Eu mesmo que fico sabendo das coisas sempre em penúltimo lugar, pois o último, dizem ser sempre o corno, eu mesmo já sabia de umas duas dúzias de amantes de Rubens.
Ele dizia saber menos que eu, não que não fossem verdadeiros os números, mas não queria lembrar.
Só o que ele sabia é que não conseguia amar ninguém, não gostava de ninguém.
Talvez nem dele mesmo.
E me mostrou a ironia quando disse que quem ele amava o odiava e quem o amava, ele desprezava.

Então eu via Rubens e sua multidão de amantes que ele mesmo gostaria de negá-las, de esquecê-las. Era um conquistador sem mérito, sem glória, ele dizia. Não fazia força, simplesmente acontecia, muitas vezes eram as garotas que ofereciam suas carícias e ele carente como todo homem largado aceitava mesmo sabendo que se arrependeria no momento seguinte.

Eu bebia meu conhaque, ele o dele, e pensava com meus botões o que poderia dizer para acabar com aquele desabafo incomum, digo, parecia-me muito triste o relato sim, sincero também, não duvidava nem por um momento de sua tristeza, mas eu também pensava naqueles que queriam ter todas as mulheres que Rubens tinha em seus braços. E não pensem vocês que a quantidade diminuía a beleza, eram todas lindas, cada uma com suas características, mas ainda assim, lindas.

Rubens que pareceu ler meus pensamentos, após passar todo o conhaque que havia no copo pela sua goela de uma vez só, me disse com um olhar suplicante: É uma maldição, Bento.

E ao ver sua suplica fiz o mesmo com meu conhaque. Apontei o dedo para ele: Rubão, faça só o que tens vontade! Só o que tens vontade...

Não sei por que o dedo em riste, talvez eu quis colocar a mesma dramaticidade na minha frase, assim como tinha feito Rubens na sua. Logo eu recebi a réplica: Mas e os domingos? O que eu faço com os domingos?


Bem, essa... Eu não soube responder.


Bento.



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quarta-feira, 18 de abril de 2012

APRESENTANDO: GIULIARD BORSANDI. A mini-série

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Era uma vez um mundo cretino chamado Tedioso.
Não. Isso não é uma história para crianças.

Meu nome é Giuliard Borsandi, sou formado jornalista e o diploma só me serve para tapar o buraco no reboco da parede de meu escritório num prédio do tempo de Dom Pedro I no centro de São Paulo. É preciso manter um mínimo de boa imagem na minha profissão. Por isso o diploma emoldurado na parede, caso contrário ele estaria no lixo.
As pessoas respeitam um diploma, não importa do que seja, desde que você tenha passado quatro anos numa universidade medíocre, ou fingindo ser estudante no bar enchendo a cara e comprando as garotas com álcool, maconha ou qualquer tipo de droga.
Não importa, se no fim, você tiver um diploma para mostrar aos outros.

Esse nunca foi meu caso, eu era um dos melhores alunos da sala, quase um puxa saco de tão CDF. Na verdade eu era um puxa saco. E foi por isso que conquistei a garota mais linda da sala, mesmo sendo bolsista.
O nome da garota era Nelia, tão rica que não precisava sequer perder seu tempo na faculdade, poderia viver só do luxo oferecido pelos pais, digo isso sem exagerar, era muito dinheiro. Mas ela tinha um discurso de revolucionariazinha que nunca passou vontade de nada e queria ser jornalista e manter-se por suas próprias pernas. Ao pensar nisso tive que rir, "viver com as próprias pernas...", ela nunca soube o que realmente significa isso. Então começamos a namorar e eu a amava.

Eu terminei a faculdade e era um gênio, fui orador da classe e um professor, o Prof. Deleno me indicou para um dos melhores jornais do país.
Uma bela vida para um garoto sem pai, de vinte e dois anos que saiu do subúrbio da Zona Leste.

Com vinte e dois anos eu tinha uma noiva ninfeta de 20, o título de melhor aluno do curso e um emprego dos sonhos. Mas como disse um jornalista amigo de redação que cuidava dos anúncios dos classificados "quanto mais alto está, mais alto é o tombo".

Eu já estava há dois anos no jornal e já namorava uma vaga de jornalista investigativo que era o melhor salário do jornal, fora o bônus, só abaixo do salário do Dr, Hernandes que era editor, é claro.
A tal vaga era meu sonho, Dr. Hernandes já tinha me oferecido o emprego e faltavam apenas alguns detalhes burocráticos, o Peralta se aposentaria no fim do mês e eu passaria a ocupar seu lugar.

Foi então que a vida de jornalista de Giuliard Borsandi foi para o lixo. Assim como irá meu diploma quando eu puder rebocar a parede.

No dia da aposentadoria de Peralta, Dr. Hernandes chamou todos para a reunião de despedida e anúncio do novo investigador, quando digo todos, é verdade, desde os anunciantes mais influentes do jornal até a tia do café, dona Rosa. Eu explodia de felicidade por já saber o que me esperava, Nelia, que escrevia para o caderno de cultura segurava minhas mãos úmidas de suor e me olhava com um sorriso apoiador no rosto.

Dr. Hernandes entra então na sala, sobe numa cadeira para dizer algumas palavras para Peralta e todos aplaudem e assoviam, outros choram pela falta que fará o velho e bom jornalista.

Peralta me ensinou muitas coisas nesses anos, eu lhe sou grato até hoje, apesar de achar que ele poderia ter me avisado da catástrofe. Talvez ele tenha tentado, seu rosto sempre sorridente, naquela hora era nulo, olhava-me e era nulo. Já Dr. Hernandes era carrancudo, sempre fora, mas desta vez era muito sorriso, o que me causou certa estranheza. Porém meu faro de jornalista só começou a delatar cheiro de podridão quando o maldito editor barrigudo e seu bigode nojento chamou Ricardo Albuquerque, um industrial e maior anunciante do jornal, ele vinha com seu terno de um milhão de dólares possivelmente, tinha a tiracolo seu filho Ricardinho, um estagiário bunda mole que não sabia a diferença entre matéria e artigo. Um ridículo baba-ovo filhinho de papai.

O velho barrigudo então anuncia:
 - Quero parabenizar o substituto do insubstituível Peralta...

Minhas mãos agora não suavam mais, derretiam. A ponto de Nelia largá-las para enxugar as suas na lateral da calça. Suspense.

 -... Uma salva de palmas para...

Eu já tinha dado um passo à frente quando ouvi o nome de minha desgraça.

 -... Nosso excelente jornalista, Ricardinho Albuquerque Júnior.

E meu estômago agora murchara a ponto de me dobrar de dor.
Todos aplaudindo, até Nelia, com decepção também, eram palmas sociáveis, mas ainda assim aplaudia.

 - Como assim, Ricardinho? Esse filho da puta não é jornalista nem de jornal de bairro. Que piada de mau gosto é essa?

Silêncio. Era o que fizeram naquele momento. Todos agora me olhavam e Nelia chutava minha canela com olhar taxativo para que eu mantivesse-me calado. Só que era muito para mim.
Houve um pigarro de alguém não muito longe de onde eu estava e aquela pose fajuta continuaria quando eu interrompi novamente.

 - Dr. Hernandes?! E aquele papo de que eu merecia essa oportunidade por minha competência? E etc.; etc.; etc.

Dr. Hernandes então, com seu bigode grisalho e sorriso amarelo devido ao cachimbo fedorento que fumava em sua sala disfarçou: - Acalme-se Giuliard, todos terão oportunidades...

Albuquerque já cochichava algo em seu ouvido quando Ricardinho com aquela cara cheia de espinhas nojentas de punheteiro comedor de puta pediu por um soco na cara. Pediu não, implorou. - Giu, se acalme. Faz parte do homem saber quando foi superado. Trabalhe isso em você.
Foi a gota d'água.

Resumindo: eu pulei em cima daquele viadinho de bosta e foram os três socos mais bem dados de toda a minha vida. Me lembro ainda dos seguranças me colocando para fora do prédio como um bandido e os gritos de Dr. Hernandes "Você nunca mais irá pisar numa redação, seu moleque! Nunca mais." E foi o que aconteceu.

Eu até tentei trabalhar em alguns jornais de bairro, mas assim que saia um artigo com meu nome eu era imediatamente chamado na sala do editor para me demitirem. Hoje eu tenho um escritório com meu nome na porta acima do cargo “investigador”, mas poderia ser "destruidor de matrimônios" ou "delator de cônjuges adúlteros".

Pratico a escrita com contos que nenhuma editora teve interesse em publicar e Nelia...
Nelia se casou com o jornalista investigativo do antigo jornal onde eu trabalhava. Agora chama-se Nelia Albuquerque.


Bento.

CONTINUA EM: GIULIARD BORSANDI (CÁPÍTULO II)

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quinta-feira, 12 de abril de 2012

UVAS VERDES II

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É certo que eu costumo dominar as situações, relações entre outras coisas, poucas.
Nem sempre é de caso pensado, as situações levam até este fim. Pode ser que isto derive da imagem que eu passo de que não me importo. Digo isto, pois existe uma necessidade incrível de conquista dentro de cada mulher. Alguns vão dizer que é orgulho, eu não, é mais que isso, é talvez a necessidade de se sentir querida, amada. Ora, todos sabem, que por mais que uma mulher se demonstre independente, madura, auto-suficiente, ela ainda será aquela que precisa de um peito (masculino ou feminino) para encostar a cabeça e relaxar.

Então eu passo a impressão de que não me importo, o que sempre é verdade, não, nem sempre. Quase sempre.

Mas existe sempre um momento na vida, aparentemente corriqueiro, quase que um acidente de percurso. Uma lei de Murphy, ou um acaso. O fato é que acontece de repente e você nem percebeu onde se perdeu ou se achou. E eu me pergunto, o que é isso?

Isso é o Destino, afinal, em algum momento ele vai te sacanear. No meu caso, em minha relação com o Destino, eu sou sempre vitimado, ele é sempre o Sátiro. Resta-me falar mal dele e ele me dar motivo para tanto.


Foi então que no meio dessas travessuras eu me vi numa contradição novelesca, entre um odiar incontínuo e um adorar repentino. Entre ódio e desejo, mordidas e beijos, eu fiquei tentando não me importar. Mas sem me enganar e enganar quem me lê agora. Há carinho, muito. Carinho na sua forma peculiar de querer por querer e pronto, é desejo sim, como não? Desejável como o fim de semana, como a lua durante a noite. Tão desejável que até a pele deseja o roçar, a boca a saliva e o cheiro as narinas. Evidente que é também desejo, como não? Afinal despisto a hipocrisia e digo sem desviar o olhar: - Não é só beleza. Apesar de ser bela de arder os olhos. Bela de judiar, como em "Tem Beleza Que é Cruel", mas se fosse só isso garanto que não resistiria ao hábito de não me importar.
Eis que os dedos encontram os cabelos da nuca, os dentes a pele e no ato, ali, bem no ato, naquele momento, eu não sei se odeio ou adoro.



Bento.



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sábado, 7 de abril de 2012

CINCO MINUTOS

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Eis que se foi mais um carnaval e eu não gostaria de fazer nenhum comentário sobre isso, mas não se fala em outra coisa.
Polêmica, polêmica. Aliás, depois do Facebook tudo vira polêmica por cinco minutos.

Eu prefiro sempre manter como está. O que acontece no carnaval fica no carnaval. Simples assim.
Todo pecado cometido no carnaval é perdoável.

Mas o rapaz rasgando as notas da apuração do desfile em São Paulo não sai da cabeça do povo.

Há anos eu tenho festejado o carnaval à base de carne assada, cerveja e pecado (da carne), portanto quando me chamaram para ver o homem pulando a cerca, roubando o envelope e rasgando-o fiz o que me cabia naquele momento: Peguei mais uma cerveja e virei a carne. Dei de ombros, ora.

Porém, para aqueles que são contra o carnaval foi um prato cheio. Para os ranzinzas que não festejam o carnaval aquilo foi a gota d'água, "onde já se viu?!" "Tem que acabar com o carnaval. Expulsem as escolas e lhe cortem as cabeças."

Fico pensando, que tipo de pessoa é contra o carnaval?

Imaginem o tamanho da minha indignação. Esses tais pseudos-revolucionários se indignam com cada coisa, num país campeão de corrupção nunca ouvi dizer: acabem com o país! Cortem-lhe a cabeça! Assim como na França, mas o carnaval...

Esses são os revoltados de cinco minutos. Nem mais nem menos. Cinco minutos.

Vou dar uma pausa do carnaval para falar do meu carnaval e fazer uma confissão: a vodca é minha Criptonita. Sempre fora.
Bebo qualquer destilado, mas a vodca...
O problema (ou não) da vodca é a amnésia, nunca houve na história da minha vida um porre de vodca que não me causasse ressaca moral que duraria meses para curar-me. Fico pensando se a guerra fria não foi um ato tomado por um porre russo regado a vodca.

Quantas besteiras não foram feitas nesse mundo por causa da vodca? E ainda haverá quem levante a bandeira: "acabem com a vodca e cortem a cabeça."

Os rebeldes de cinco minutos esperam qualquer oportunidade para defender uma causa utópica.

Acabar com o carnaval, vejam que absurdo.
Fico pensando que tipo de pessoa é contra o carnaval e chego à conclusão que isso é ser "do contra" demais.
Querer acabar com o carnaval é como querer acabar com o chá das cinco dos ingleses, é o mesmo que pedir aos americanos que deixem de comemorar o 4 de julho, ou acabar com o futebol.

O brasileiro não gosta de resolver problemas, pensar em soluções exige dedicação e tempo e esse último tem sido cada vez mais escasso. Tão escasso que a rebeldia só dura cinco minutos, depois pensamos em coisas mais importantes.
Quem pede o fim do carnaval é o mesmo que diz que a solução para acabar com a fome no mundo é a morte. Cortem as cabeças, morto não come. Alguns ainda defendem a proibição do regime, mas esses são os gordos.
Soluções rápidas para um mundo instantâneo onde o tempo é cada vez mais escasso.

Alguns rebeldes de cinco minutos mais exaltados ainda vão dizer que para acabar com as enchentes é preciso cortar a cabeça de São Pedro e parar com as chuvas.

Mas vou confessar uma coisa, fiquei com um fio de inveja do rapaz que pulou a cerca e resolveu seu problema de forma tão natural. Eu sou um dramático incurável, daqueles que vê tragédia em gaveta de cueca e sofre antecipado quando me restam apenas duas peças. Duas peças? Meu Deus, e agora?

Quanta facilidade de solucionar um problema. Rasgou, rasgou e guardou no sexo. No sexo. Não é qualquer coisa que guardamos no sexo, digo que foi um "rasgar" passional. Um “rasgar” de novela mexicana. Está rasgado e pronto.

Que lição que nos deu esse homem.
Ele poderia guardar a raiva e reclamar seus direitos no Facebook depois, como fazem os rebeldes de cinco minutos, porém preferiu resolver o problema. É bem verdade que não resolveu nada, mas valeu o esforço.


Bento.

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segunda-feira, 2 de abril de 2012

UVAS VERDES (Arriba, abajo, al centro)

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Eis que me disseram: mas você não tem sobrenome? Evidente que sim, eu respondi. Para quem não sabe, Bento é meu sobrenome, o meu nome é outro.

Mas aí a pergunta já tinha se espalhado e todos afirmavam: você não tem sobrenome. Isso foi de uma calúnia desmedida. Afinal não é porque meu sobrenome pode ser adotado também como nome que ele não pode ser outra coisa.

Ao insistirem que eu não teria um sobrenome pensei logo na tentativa de me tirar a identidade, dramático que sou imaginei como seria sem sobrenome e sem identidade.

Bento era meu avô por parte de mãe, logo ela é a Sra. Bento, e dos meus dois irmãos eu sou o único Bento representante.

Eu pensei em tentar uma crônica mais romântica, pensava numa outra pessoa antes de começar a falar sobre meu nome, mas a verdade é que é praticamente impossível falar de qualquer pessoa, qualquer outra coisa, sem adaptar ao meu egoísmo. Como costumo dizer, cada um tem uma verdade e é preciso que eu identifique a minha para que possa me encontrar na reflexão sobre meu cotidiano.

De qualquer maneira deixei a intenção de parecer romântico a quinze parágrafos atrás, não que seja uma segunda-feira insensível, de maneira nenhuma, só acredito que seja uma segunda para ser lúcido. Eu disse lúcido, não lúdico. Lúdico é outra coisa.

Eis então que eu penso na minha identidade e a molecagem vivida todas as tardes e sinto uma duplicidade de informações. Vejo minha rebeldia em minha frente, olhando em meus olhos e os seus são verdes. Eu gosto muito de verde, principalmente uvas verdes, porém, não cairei na tentação de fazer alusão dos olhos com uvas. Sei que me vejo naquele par de olhos e não é só reflexo, sou eu.

Me vejo em cada gesto obsceno pois eles são meus, seriam meus caso não fossem dirigidos para mim.

Vou aqui abrir um parênteses para dizer que alguns textos meus demoram mais que um dia para irem do início ao fim. Acontece isso pela falta de tempo e correria do dia-a-dia e como algumas coisas que digo são tão atuais que é inevitável acontecer reviravoltas após o início que modifica totalmente o final do texto. Não se preocupem, a obra não perde sua sinceridade por causa disso, só mudará o fato de haver algumas pessoas lamentando o desenrolar da história.

Pronto! Após este parêntese enorme, adianto "o homem mais infeliz do mundo é aquele que descobre que nem sempre vale tanto sacrifício por três segundos de prazer", aos que se fizerem de desentendidos recomendo uma maior compreensão do meu outro texto "Prazer, Meu Nome é Bunda" que deixa claro que numa relação que se prioriza a bunda e a carne eu darei sempre preferência aos osso e tetas.

Eu permito-me por vezes adestrar minha sinceridade na tentativa de evitar que confundam-na com rispidez, fato que acontece sempre, mas existem certas pessoas que tendem a confundir isso com ingenuidade. Olhe só, ingenuidade, logo de minha parte. Eu tenho muitos defeitos que não faço questão nenhuma de esconder, eu tenho qualidade que deixo escapar entre os dedos numa linha ou outra, mas é raro, para que não pareça egocêntrico. No entanto, ingenuidade não está, nem de longe, no meio de uma dessas coisas.

Se me perguntarem, é claro que vou dizer que não vale a pena deixar de externar qualquer coisa em si para agradar um outro alguém, porém não nego que sempre vai existir a tentação de fazê-lo, para que não assuste Fulanos ou Beltranos, chamo isso de "preparar o terreno", uma introdução para preparar os ouvidos para o que está por vir.

O fato é que confundiram este, que é o indiferente, com o ingênuo. Vale também lembrar, que qualquer impressão errada que eu possa, mesmo que inconscientemente ter transmitido pessoalmente, seria desmentida imediatamente por este meio de escrita, pois as linhas não mentem, as letras não omitem e os parágrafos são transparentes como água de bica.

E foi que ficamos assim, nessa relação de bunda, carne e sinceridade de uma via só (a minha) e eu preferindo ossos, tetas e a reciprocidade da intenção. Eu só reivindico o que posso lidar, da outra havia reclamações que eu pude suprir -- sem me gabar -- de olhos fechados, porém ter do que reclamar faz tanta parte de nosso cotidiano -- assim como o sol, a chuva, a enxaqueca -- que nunca nos acostumamos com a falta. Reclamar é mais fácil que se adaptar com algo novo, como o mendigo que ganha na loteria e não se acostuma com a água quente do banho.

Ainda sobre isso, eu já disse aqui que jamais me defenderia de qualquer acusação, o bom neste caso é que nem há motivos para isso, o que geralmente é incomum. Ah, mas nada é em vão, existiu uma certa visita que um dia eu esperei, quem acompanha o lamentar do autor deve também reconhecer como o apelido de uma certa princesa, que reclamava e reivindicava algumas coisas que eu pude colocar o antídoto em prática e acho que me saí bem, remediando o que eu achava irremediável.

Mas é bom deixar claro que não há motivos para maiores preocupações, pois assim como eu bebo indiferença com duas pedras de álcool, ela com certeza, chupa do desprendimento com um trago de tequila. Arriba, abajo, al centro…



Bento.

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