Estou pendurado numa
janela de um hotel barato no centro de São Paulo, num beco cheio de lixo,
ratos, gatos e mendigos.
Eu estou disfarçado de
mendigo para passar despercebido, mas também, com meu salário e minhas roupas,
nem precisei fazer muito esforço.
As únicas coisas que
me diferenciam de um morador de rua são o cheiro e a máquina fotográfica no
pescoço.
Eu sou investigador
particular e me chamo Giuliard Borsandi e fui pago para tirar algumas fotos da
esposa de um pastor, que ele desconfia estar trepando com um tal de obreiro,
seja lá o que for isso.
Veja que nem em mulher
de pastor pode-se confiar mais. O mundo acabou e esqueceram de jogar terra em
cima.
Mas a tal serva de
Deus é esperta, escolhe sempre hotéis verticais, sempre acima do quarto andar,
com janelas e cortinas fechadas. Desta vez ela só esqueceu de conferir a altura
do galpão abandonado ao lado. Foi difícil escalar, mas aqui estou.
Arriscando minha vida
por uma merreca que mal paga os cigarros do mês. E tudo isso no anonimato,
digo, para quem tinha tudo para se tornar um jornalista investigativo famoso e
digno de prêmio, eu me perdi em algum lugar.
Sei que já contei
minha história para vocês (Apresentando: Giuliard Borsandi. Mini série), no entanto
para quem não sabe, eu sou um ex-jornalista que espanquei o cara que roubou
minha promoção e minha noiva. Na verdade não espanquei, foram três socos bem
dados que o fizeram falar fofo durante um bom tempo, mas não chegou a ser
espancamento. De qualquer forma, tanto faz, mas deve ser verdade, afinal dizem
que tudo que está no jornal é verdade.
Então já passou da uma
da manhã e essa vaca não me dá uma brecha para uma foto. Eu poderia dizer ao
pastor que a mulher é uma santa e acabar com esse sofrimento, porém quero
preservar um mínimo de vergonha na porra dessa minha cara. E com meu passado de
ter sido trocado por um amolfadinha punheteiro comedor de puta - tomara que
pegue uma sífilis, é o que desejo para Nelia - é minha obrigação defender os
fracos e oprimidos por mulheres vadias. Longe de mim querer ser um herói, não
me entendam mal, eu sequer consigo pagar minhas contas e fazer a barba.
Meu pau não vê duas
pernas abertas vai fazer um mês e eu nem sei o nome da última fulana que comi
em cima da escrivaninha do escritório. Só sei que ela era boa, muito boa. Ela
foi me procurar para pegar o marido rico trepando com a empregada, parecia que
eles tinham um contrato de casamento que no caso de adultério o traído ficaria
com tudo.
Vagina cara dessa
empregadinha. Também, até eu gostaria de pegá-la por trás como fez o tal marido
rico. Dava dó de deixar aquela moreninha sem uma bela chupada.
Só que homem é burro
pra cacete, se a carne é fraca amigo, não
assine contratos. Esse é um lema que eu vou levar para minha vida.
Magali! Lembrei o nome
da madame que me contratou, não era de se jogar fora, é bem verdade que não era
bonita, o dinheiro ajudava muito.
Cheirosa, tão cheirosa
que toda vez que ela entrava no meu escritório seu perfume ficava lá por dias.
Na verdade chegava a me irritar aquele perfume, muito doce, não gosto de
perfumes doces, porém com o tempo me acostumei. É bom sentir algo de feminino
naquele cubículo nojento que chamo de escritório. Seis metros quadrados com uma
janela, uma porta, uma mesa e um arquivo. E só.
Magali me tirou o
atraso, mas agora já tava na hora de correr atrás do prejuízo de novo.
Bom, a crente do diabo
fugiu novamente e eu fui para o escritório. Abri a garrafa de scotch tupiniquim
e a primeira dose foi num gole só. Sentia frio com aquelas roupas molhadas
devido a chuva de verão. Peguei uma trouxa de roupa seca que havia numa mala
ao lado do arquivo, preparada exclusivamente para essas ocasiões, troquei-as e
me joguei na cadeira e esticar as pernas sobre a mesa. Abri a gaveta onde
guardo os destilados e servi mais uma dose, dessa vez dupla. A gaveta da
escrivaninha que sempre emperra, precisou de um leve soco de baixo para cima
para ela deslizar suavemente. Acendo um cigarro e dou um trago demorado,
"dia difícil" penso em voz alta. Giro o dial do pequeno rádio de
pilha e acho uma introdução de guitarras que agrada meus ouvidos e fico ali
pensando se a mulher do pastor vai me passar para trás novamente na próxima
emboscada. De qualquer forma, a adultera só sai para vadiar quando o pastor
viaja, o que só vai acontecer na próxima sexta-feira, logo, terei quase uma
semana para preparar um novo plano.
Acendo outro cigarro e
fico olhando a chuva pela janela do escritório, vejo que algumas gotas passam
pelo pedaço de papelão improvisado num quadrado que antes tinha um vidro que
fora quebrado por uma pedra, "precisa de mais fita" pensei comigo.
Então peguei no sono.
Estava cansado e não era só fisicamente.
Eis que acordo pela
manhã com a campainha que mais parecia uma cabra sendo estuprada por um
caipira.
Era uma amiga de muito
tempo atrás...
Bento.
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